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Os benefícios das fibras para a cinética do parto de fêmeas suínas – Parte II

Escrito por: Bruno Bracco Donateli Muro - Médico Veterinário graduado pela Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da Universidade de São Paulo (FMVZ-USP). Mestre em reprodução animal (2018) pelo Departamento de Reprodução Animal (VRA) da FMVZ-USP. Atualmente é doutorando no Departamento de Nutrição e Produção Animal (VNP) da FMVZ-USP com ênfase em sistemas de produção de suínos, contribuindo junto ao Laboratório de Pesquisa em Suínos (LPS) da FMVZ- USP. , César Augusto Pospissil Garbossa - Médico Veterinário (2008) pela Universidade Estadual do Centro Oeste do Paraná (Unicentro), possui especialização em Gestão de Agronegócios pela Unicentro (2008). É mestre (2010) em Ciências Veterinárias e doutor (2014) em produção e nutrição de não ruminantes, pela Universidade Federal de Lavras. Realizou seu pós-doutorado em produção e nutrição de não ruminantes pela Universidade Federal de Lavras em 2016. Atualmente é professor do Departamento de Nutrição e Produção Animal (VNP) da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da Universidade de São Paulo (FMVZ/USP) e coordena o Laboratório de Pesquisa em Suínos e o Laboratório Multiusuário de Nutrição Animal e Bromatologia. Atua principalmente nos seguintes temas: suínos, suinocultura, saúde intestinal, matrizes, aditivos e nutrição.

Fornecimento de Energia

A espécie suína, dentre as espécies domésticas, é a que apresenta maior taxa de mortalidade perinatal, que inclui natimortos e mortes nas primeiras semanas de vida. Estima-se que 40% dessa mortalidade ocorra nas primeiras 48 horas após o nascimento (Quesnel et al., 2012), o que representa um problema econômico e de bem-estar (Mota-Rojas et al., 2016).

Este quadro tem sido associado, em parte:

Em um estudo recente, Feyera et al. (2018) demonstraram que a quantidade de energia disponível no início do parto é um fator determinante para a duração do parto. Fêmeas suínas que iniciam o parto com concentrações plasmáticas de glicose arterial (artéria uterina) abaixo de 3 mMol têm graves prejuízos na cinética do parto, com aumento na taxa de natimortalidade e precisam de maior assistência ao parto.

De forma prática, fêmeas que iniciam o parto dentro de 3 horas após se alimentarem têm menor duração de parto e uma menor necessidade de assistência ao parto, quando comparadas com fêmeas que iniciaram o parto após 6 horas da última alimentação.

A fêmea suína pode depletar seu estoque de energia disponível para a fase expulsiva antes mesmo do início do parto.

O aumento da atividade física direcionado para confecção de ninho (6-12 horas antes do parto), associado a intensa produção de colostro e as contrações rítmicas e involuntárias do miométrio e da musculatura abdominal são altamente dependentes de energia e podem resultar na depleção dos estoques de glicogênio e tornar as fêmeas parturientes mais susceptíveis às variações da concentração de glicose plasmática.

De forma prática, Feyera et al. (2017) encontrou uma diminuição do número de natimortos e na mortalidade dos leitões devido à baixa vitalidade em porcas alimentadas com uma dieta de transição rica em fibras.

Os AGCC provenientes da fermentação das fibras solúveis podem ser uma importante fonte de energia no periparto, além de auxiliarem na manutenção das reservas de glicose.

Fibras solúveis também estão relacionadas a uma maior captação de energia pós-prandial pelo trato gastrointestinal e a uma estabilização dos níveis de glicemia interprandial, o que é de extrema importância em rebanhos onde não é possível alimentar a porca parturiente mais de duas vezes ao dia.

Ressalta-se, no entanto, que durante a fase expulsiva do parto, o útero utiliza apenas glicose e triglicerídeos como fonte de energia para as intensas contrações.

Sendo assim, especula-se que os benefícios da fibra estejam relacionados ao metabolismo energético da fêmea antes do parto e, portanto, grandes benefícios no processo de parto podem ser alcançados com uma dieta contendo fontes de fibras no pré-parto associadas a fontes de glicose e triglicerídeos para serem utilizadas como energia prontamente disponível imediatamente antes e/ou durante o parto.

Constipação

A constipação é um problema grave que pode atingir cerca de 70% das fêmeas parturientes do rebanho.

A constipação causa:

Em um passado recente, a restrição alimentar (jejum) da fêmea suína na data prevista do parto era um manejo comumente utilizado para evitar a constipação durante o parto. No entanto, com os resultados de estudos recentes que demonstraram a importância da disponibilidade energética para otimizar a cinética do parto, novas diretrizes para o manejo alimentar da fêmea parturiente têm sido utilizadas.

Feyera et al. (2018) propôs que a fêmeas sejam alimentadas oito vezes ao dia de modo a otimizar as características de cinética do parto. No entanto, essas novas diretrizes podem aumentar a possibilidade de ocorrência de constipação da fêmea durante o parto.

Por isso, uma formulação de dieta de transição que incorpore ingredientes funcionais que atendam as necessidades da fêmea no periparto se faz necessária.

Além dos benefícios supracitados da inclusão de fibras para o metabolismo energético da fêmea parturiente, esses ingredientes também podem contribuir de maneira significativa na prevenção de constipação.

Assim como os efeitos sobre o metabolismo energético, os benefícios na prevenção da constipação dependem das propriedades físico-químicas da fibra.

Se por um lado a inclusão fibras solúveis e altamente fermentáveis contribui de maneira mais efetiva para o metabolismo energético, as fibras insolúveis podem assumir o protagonismo quando o objetivo é prevenir constipação

A capacidade de reter moléculas de água permite que as fibras insolúveis:

Aumentem a maciez das fezes, o que, por sua vez, diminui a probabilidade de constipação.

As fezes moles podem impedir o bloqueio físico do canal de parto e permitir a rápida passagem dos leitões durante o parto (OLIVIERO et al., 2009). Além disso, as fibras insolúveis aumentam a taxa de passagem no trato gastrointestinal, diminuindo a probabilidade de absorção de endotoxinas bacterianas (lipopolissacarídeos), que podem influenciar as alterações endócrinas associadas ao parto, resultando em inércia uterina (PELTONIEMI et al., 2019).

Considerações Finais

As necessidades nutricionais da fêmea suína mudam rapidamente durante o período de transição, portanto, dietas específicas podem trazer resultados melhores para esse período.


As fibras podem ser uma ferramenta muito importante nessas dietas.
No entanto, as fibras pertencem a um grupo de nutrientes com características bastante heterogêneas e com funções distintas de acordo com suas propriedades físico-químicas.

Portanto, para se obter máxima eficiência do uso de fibras nas dietas de transição, com especial atenção para a cinética do parto, é interessante combinar fibras com diferentes propriedades e funções no metabolismo.

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