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Desmame de suínos: existe idade ideal?


Um assunto recente em discussão é: qual é a melhor idade ao desmame? Contudo, não existe uma mesma resposta para todas as granjas, uma vez que há muitas variáveis a serem analisadas neste contexto.

Um ponto importante a ser considerado é o objetivo de cada sistema de produção, ou seja, o foco é a venda de leitões desmamados ou terminados? A preocupação maior é com a quantidade de animais abatidos por ano ou com uma qualidade específi ca dos mesmos?

» Independente disso, há um movimento entre as agroindústrias em todo o mundo para aumentar a idade ao desmame, partindo dos tradicionais 21 dias.
Isto porque há um consenso de que, com esta idade, as linhagens atuais não apresentam desempenho satisfatório na creche, fazendo com que haja uma grande preocupação com os primeiros dias pós-desmame e um gasto maior com nutrição, manejo e mão de obra com o leitão desmamado.

Também, em um desmame com idade média de 21 dias é normal que existam leitegadas com 17 -18 dias neste mesmo lote. Apesar da importância do tema, é extremamente necessário realizar pesquisas neste assunto antes de adotar uma nova e mais alta idade de desmame.

Perguntas como:
O desempenho em creche e terminação é suficientemente melhor para justificar a mudança deste manejo?

Por meio de uma análise financeira, qual a idade que maximiza a margem do sistema?

Qual a melhor estratégia para realizar o aumento da idade?

Além de vários outros pontos em sanidade/ imunidade do rebanho, nutrição e estrutura das granjas, por exemplo, merecem entrar nessa discussão.

O objetivo desta revisão é elencar os principais pontos que estão relacionados à idade ao desmame e mostrar através de sua grande importância para os sistemas de produção, que nenhuma decisão deve ser tomada se não for baseada em pesquisa.


Leitões mais jovens possuem uma limitada capacidade digestiva e apresentam um menor consumo de ração. Porém, este baixo desempenho após o desmame pode ser encurtado e menos intenso quando leitões são desmamados com uma idade mais avançada, mesmo que poucos dias a mais (Colson et al., 2006).
Por fim, podemos concluir que a idade ao desmame possui relação direta com a maturidade comportamental (Gonyou et al., 1998), fisiológica (Dong e Pluske, 2007), imunológica J.E.G. faccin et al. (Bailey et al., 2004) e, consequentemente com o nível de adaptação aos estresses da fase inicial da creche.

Idade ao desmame e o efeito no desempenho em creche e terminação

Com o objetivo de reduzir a transmissão vertical de doenças da fêmea para sua leitegada, programas de desmame precoce foram muito praticados entre os anos 80 e 90 (Tang et al, 1999).

Esta estratégia, além de produzir animais livres de algumas doenças, otimizava o uso das instalações de maternidade, uma vez que o período de ocupação era reduzido e produzia maior volume leitões/ano (Harris, 2000).

Porém, ao se avaliar o desempenho zootécnico destes leitões nas fases subsequentes, principalmente nos primeiros dias de creche, era nítido o déficit em crescimento e a alta taxa de perdas (Patience et al. 2000).

Levando em consideração a importância do tema “idade ao desmame”, muitos estudos comparando, geralmente, duas idades, foram realizados nos últimos anos. No entanto, os resultados nem sempre seguem a mesma tendência.

Alguns trabalhos indicam que mesmo aumentando a idade ao desmame e, consequentemente, o peso de alojamento na creche, próximo à sétima semana de vida, a diferença de peso se anula e este permanece igual até o abate (Leibbrandt et al. 1975, Dunshea, et al. 2003, Collins et al. 2010).

Já um estudo com aproximadamente 2.500 leitões que avaliou o desempenho de creche de leitões com idades médias ao desmame de 15 e 20 dias (Smith et al. 2008), encontrou que para cada dia a mais na lactação, dentro da amplitude dos tratamentos, houve um aumento de 6% no peso ao desmame e de 3,3% no peso de saída da creche.

Apesar dos autores não encontrarem diferenças na mortalidade, houve um efeito positivo em relação ao percentual de animais subdesenvolvidos, que foi significativamente menor em animais desmamados mais tardiamente.

Além disso, leitões desmamados aos 20 dias tiveram um aumento ao redor de 2,2% no GPMD e 2,4% no CMD para cada dia a mais de idade em comparação com leitões desmamados aos 15 dias.

Avaliando aproximadamente 5.000 leitões em dois experimentos, Main et al., (2004b), comprovou que ao se aumentar a idade ao desmame de 12 até 21,5 dias o desempenho zootécnico é diretamente influenciado de maneira positiva.

Devido ao maior peso ao desmame gerado pela maior idade, os autores demonstram, na fase de creche, melhorias lineares em GPMD, CMD, mortalidade e peso final, e quadráticas para CV de alojamento, CA e CV final. Já na terminação, com o aumento da idade de desmame, houve melhorias lineares de GPMD, peso fi nal e CV ao abate (nesta fase CMD e CA não foram aferidos).

Por meio de um compilado destes dados, foi possível gerar um modelo que prediz quanto é possível se evoluir em determinados indicadores para cada dia de aumento de idade ao desmame (Tabela 1)

Duração da lactação e desempenho no parto subsequente

A maioria das matrizes apresenta um novo cio fértil entre 25 e 30 dias pós-parto em sistemas com desmame de 21 dias. Isto porque o tempo necessário para a completa involução uterina, por meio de contrações reguladas pela ocitocina na fêmea suína, é de 28-30 dias após o parto (Senger, 2003)
Através deste fato, é pertinente imaginar que fêmeas com desmame mais tardio e, consequentemente, tendo mais tempo para a completa preparação do trato uterino para uma próxima gestação, possam produzir mais leitões no parto seguinte.

Alguns estudos demonstram uma correlação positiva entre duração da lactação e tamanho da leitegada subsequente. Conforme Stein et al. (1996), planteis que são desmamados mais cedo tendem a apresentar leitegadas menores quando comparados àqueles com desmame tardio.
De acordo com Mabry et al. (1996), há diminuição no número de nascidos vivos por leitegada quando o período de lactação é reduzido, já Gaustad-Aas et al. (2004) mostraram que matrizes desmamadas no período entre 8-21 dias possuem tamanho de leitegada seguinte menor quando comparadas a fêmeas com desmame entre 22-35 dias.

Em uma análise recente de um banco de dados com mais 400 mil partos de fêmeas de primeiro a sétimo parto e idades de desmame entre 14 e 26 dias, Ketchem et al. (2017) observaram a mesma correlação dos trabalhos citados acima.

Porém, o maior número de nascidos no parto subsequente não é sempre linear à medida que a duração da lactação aumenta.
A Figura 1 mostra que até 21 dias de lactação, há um incremento de aproximadamente de 0,15 leitões/dia na próxima leitegada de uma mesma matriz. Já em idades mais avançadas, partindo de 21 para 26 dias, o desempenho no parto subsequente praticamente não é afetado, acrescendo cerca de 0,05 leitões/dia de aumento da duração da lactação.

Portanto, há um ganho importante em nascidos totais se partimos de rebanhos que desmamam com menos de 3 semanas, no entanto, a partir de 21 dias, não se pode contar com um incremento representativo de mais leitões por parto.

Além disso, os 0,05 leitões a mais são reduzidos se levarmos em consideração o percentual de natimortos, mumificados e a maior mortalidade na maternidade já que os leitões permanecem por mais tempo com a matriz.

Impacto financeiro do aumento da idade ao desmame

O aumento da idade de desmame remete ao cálculo financeiro que esta mudança de manejo gera no sistema produtivo como um todo. Isto por que são inúmeras alterações importantes relacionadas a custos e a receitas que esta ação produz.

Atualmente, a maneira mais utilizada para avaliação de custos e receitas assume que todos os leitões desmamados que atinjam um mínimo padrão de qualidade apresentam o mesmo valor.

Com isso, muitos sistemas utilizam como base de cálculo a variável “por leitão desmamado”. Este fato muitas vezes encoraja os sistemas a desmamar leitões com menor idade, mas com maior volume (Main et al., 2004a), principalmente em momentos positivos do mercado.

Para uma granja de 4.000 matrizes com 800 espaços de maternidade que deseja, por exemplo, desmamar 18 fêmeas a mais por semana, aumentando o volume de vendas em, aproximadamente, 210 leitões/semana, o impacto seria uma redução de 2 dias na idade ao desmame.

Porém, isto geralmente não se torna tão benéfico para as fases subsequentes, pois para avaliação de custos e de receitas das fases de creche e terminação, a variável base é o peso e a sua relação entre os kg entregues por animal desmamado e quanto tempo é necessário para atingir tal peso.

Em 2004a, Main et al. ao realizarem dois experimentos com idades ao desmame de 12, 15, 18 e 21 (experimento 1) e 15,5, 18,5 e 21,5 (experimento 2) concluíram que há um aumento linear no lucro por leitão desmamado à medida que se eleva a idade (Tabela 2).

Sob um contexto norte americano daquela época, a melhoria de desempenho zootécnico, a redução do período de ocupação das instalações com consequente maior número de lotes/ano, e ainda uma maior proporção de animais abatidos/ leitões desmamados são variáveis chave para justificar o aumento da idade ao desmame no ponto de vista financeiro. Também, o resultado foi semelhante em cenário de tempo fixo (limitação de espaço na terminação) e peso fixo (sem limitação de espaço na terminação).


A expectativa de continuidade linear no lucro/ desmamado para idades superiores às usadas por Main et al. (2005), no entanto, deve ser avaliada com cautela. Nos experimentos 1 e 2 a mortalidade caracterizou-se por uma redução de 6.8% para 3.7% e de 3.4% para 2,5%, respectivamente à medida que a idade ao desmame aumentou de 18 para 21 dias.

Em um cenário atual onde já existem empresas com desmames de 4 semanas, ao compararmos leitões desmamados com 25 e 28 dias, não é esperado que haja grandes diferenças em mortalidade no período de creche e de terminação.

Neste caso, pode-se chegar a um ponto ótimo de margem líquida e de utilização das instalações antes dos 28 dias. Obviamente, um dos gargalos para se utilizar uma lactação que não tenha uma duração múltipla de 7 (14, 21 ou 28, por exemplo), como a de 25 dias, a não ser que o sistema faça mais de um desmame/ semana, este ocorrerá sempre em dias diferentes da semana.

Há ainda um questionamento pertinente: Desmamar leitões com maior idade possibilitaria a redução do custo de programas nutricionais para a fase de creche?

No estudo de Main et al. (2004b), os autores não observaram nenhuma interação entre idades de 15,5, 18,5 e 21,5 dias e dietas simples e complexas (inclusão de plasma spray-dried e maior concentração de lactose).

Já Collins et al., (2013), demonstraram que o aumento da idade pode reduzir o custo de ração por kg produzido em até 7% durante a fase de creche.
Entretanto, são necessários mais estudos que visem simplificar o programa nutricional na fase de creche para idades mais avançadas que as utilizadas no estudo supracitado.

É estimado que para cada dia de aumento de idade ao desmame cerca de 3,5% de celas parideiras a mais devem ser implantadas na maternidade.
Também, como citado anteriormente, o aumento da duração da lactação exerce efeito positivo no número de leitões nascidos no parto subsequente.

Outra variável importante que está relacionada à eficiência e à lucratividade de uma granja é a otimização do uso dos espaços de maternidade.
Neste contexto, a estratégia utilizada para se atingir uma maior idade ao desmame é essencial para que a margem fi nanceira através da venda do leitão desmamado mais velho seja maximizada.

Desta forma, adicionar espaços de lactação, transferir as matrizes para a maternidade 2 dias mais tarde (de 110 para 112 dias de gestação) e reduzir um dia de vazio parece ser a estratégia mais rentável quando comparada a outras três ferramentas: simples adição de celas parideiras ou somente otimizar o uso dos espaços de maternidade ou redução do plantel sem alteração na estrutura da granja (Main et al., 2005; Vier, 2015).

Nestes dois estudos, um norte-americano e um brasileiro, a estratégia acima citada como mais rentável chegou a aumentar U$ 1,42 e R$ 1,08 de lucro/desmamado, respectivamente e, em ambos, pode-se avançar de 15,5 para 20 – 21 dias de idade ao desmame.
A grande contribuição para esta maior renda foi o maior peso, responsável por cerca de 75% desta melhoria. Os demais 25% são atribuídos ao maior número de leitões desmamados, uma vez que o aumento no número de nascidos também foi considerado.

Vale ressaltar que cada sistema de produção precisa avaliar qual seria a melhor idade ao desmame devido à variação nos custos de alimentação, ambiência, custo operacional, estrutura, genética e, principalmente, na taxa de mortalidade e descarte de leitões.

Sistemas com pior status sanitário e maiores taxas de perdas entre o desmame ao abate, provavelmente terão melhor desfrute do aumento da idade ao desmame e maior “ponto de corte” quando comparados a sistemas com melhores índices de saúde do rebanho.

 

Uso de antimicrobianos e a idade ao desmame

Segundo a Organização Mundial da Saúde, a resistência a antimicrobianos é uma das maiores ameaças para a saúde global, segurança de alimentos e desenvolvimento, sendo que a má utilização destes fármacos em humanos e animais acelera este processo (Who, 2016).
Nessa perspectiva, há duas maneiras para evitar a resistência bacteriana: desenvolver ou alterar drogas as quais os agentes patogênicos alvos são susceptíveis ou tomar medidas para atrasar a resistência bacteriana limitando o seu uso (Who, 2002).

Objetivando evitar os efeitos negativos que a suspensão da utilização de promotores de crescimento pode acarretar sobre a produtividade dos leitões, buscam-se alternativas que possam melhorar as condições de higiene e o status imunológico do rebanho.

Embora a grande maioria dos leitões consigam superar a fase logo após o desmame e apresentar boa performance zootécnica, novas pesquisas tem demonstrado que quanto mais cedo o leitão é exposto a estresses como os do desmame, mais negativos são os impactos na formação e função da barreira gastrointestinal.

Este fato guia para consequências deletérias mais duradouras na saúde intestinal e na susceptibilidade para doenças durante toda a vida produtiva do suíno (Moeser et al., 2017).

Tal afirmação sugere a hipótese de que uma alternativa para redução/ausência do uso de antimicrobianos pode ser o aumento da idade de desmame dos leitões.

Em um estudo realizado por Postma et al. (2015), um questionário sobre alternativas para o uso de agentes antimicrobianos foi respondido por 111 especialistas em saúde de suínos provenientes de diversos países europeus.

Foi solicitado aos especialistas o ranqueamento (com notas de 0 a 10) de 19 tópicos que poderiam torna-se possíveis alternativas ao uso destes fármacos de acordo com a sua eficácia, viabilidade e retorno financeiro.

O estudo observou que, o manejo do aumento da idade de desmame, apresentou médias de 7,2; 5,9 e 6,4 para eficiência, viabilidade e retorno financeiro, respectivamente.
Ao final, esta prática ficou entre as Top10 ações alternativas para a redução do uso de antimicrobianos na suinocultura.

Diante dos desafios impostos pelas pressões da sociedade e das legislações, em relação ao BEA e à proibição do uso de antimicrobianos como promotores de crescimento, serão necessárias medidas de manejo adequadas para maximizar o desempenho dos leitões sob este novo cenário.

É possível que o aumento da idade de desmame dos leitões seja uma alternativa eficaz para os efeitos negativos que a não utilização de antimicrobianos promotores de crescimento podem causar à produtividade animal.

Nessa perspectiva, torna-se necessário estudos que simulem tais pressuposições e que sirvam de suporte para a mudança deste fator para o sistema (Tokach & Vier, 2017).


Por: Jamil Elias Ghiggi Faccin | Setor de Suínos, Faculdade de Veterinária, Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Porto Alegre, RS. Diretor de conteúdo do Grupo Academia Suína.

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