Em escala global, de acordo com o USDA (2024), os Estados Unidos lideram o ranking de produção de sorgo (Sorghum bicolor L. Moench) com 8,071 milhões de toneladas, seguidos por Nigeria e Sudão.
Conforme discutido no XXXIII Congresso Nacional de Milho e Sorgo, ocorrido em 2022, a cultura do sorgo apresenta perspectivas promissoras, especialmente diante do potencial aumento nas exportações de milho para a China, o que torna o sorgo uma alternativa economicamente viável. Além disso, o sorgo apresenta um custo de produção de cerca de 20% inferior ao do milho (Fialho et al., 2002).
No entanto, sua inclusão requer uma análise cuidadosa das variações em sua composição, especialmente em relação a grande quantidade taninos e fatores anti qualitativos, que podem impactar negativamente a digestibilidade e o desempenho dos animais (Selle et al., 2018).
CARACTERÍSTICAS MORFOLÓGICAS E COMPOSIÇÃO DO GRÃO
[cadastrar] Existem diversas variedades de sorgo, incluindo o sorgo forrageiro, o sacarino, vassoura, biomassa e o granífero, utilizados na alimentação dos animais monogástricos.
O sorgo granífero é um tipo de sorgo de porte baixo que produz uma panícula na extremidade superior onde se localizam os grãos. As cultivares graníferas se diferem quanto ao rendimento dos grãos, na tolerância às doenças, ao ciclo vegetativo e outras características agronômicas (Melo et al., 2023).
Ele é constituído por três partes principais: o pericarpo, o endosperma e o gérmen (Figura 1). A proporção relativa desses componentes no grão é variável, mas na maioria dos casos é de 6%, 84% e 10%, respectivamente (Pereira Filho e Rodrigues., 2015).
Figura 1. Estrutura do grão de sorgo. Fonte: Adaptado de Nunes (2000).
O pericarpo é formado por três camadas: epicarpo, mesocarpo e endocarpo e, logo abaixo, há a testa, estrutura onde se localizam os taninos.
O gérmen é formado por dois tecidos, caulículo e escutelo, contendo lipídeos, proteínas, enzimas e minerais.
Na região do endosperma, farináceo e vítreo, são encontrados cerca de 88% dos grânulos de amido e 80% das proteínas (Scramin, 2013; Pereira Filho e Rodrigues., 2015).
Além do mais, os grânulos de amido também são depositados no mesocarpo, sendo essa uma explicação pelo alto conteúdo de amido encontrado neste cereal (Nunes, 2000).
Tabela 1. Teores de proteína bruta e amido de diferentes grãos de sorgo.
Fontes: ¹ Rostagno et al., (2017); ² Martino et al., (2012); ³ Antunes et al., (2007); 4 López e Stumpf Junior, (2000).
Por ser um cereal energético, o amido contido no sorgo corresponde a maior parcela do grão, onde 70-80% é formado por cadeias de amilopectina e 20-30% por cadeias de amilose.
Em termos de valores de aproveitamento de energia, o grão de sorgo apresenta 3204 kcal/kg de energia metabolizável para aves e 3358 kcal/ kg para suínos, em comparação com o milho, que apresenta 3364 kcal/kg e 3360 kcal/kg, conforme relatado por Rostagno et al. (2017).
- A porção do endosperma vítreo do sorgo é mais espesso quando comparado ao endosperma farináceo que é composto, em sua maioria, por proteínas e polissacarídeos não amiláceos, caracterizando-se por ser denso, duro e resistente a penetração da água e a atividade enzimática (Sapaterro et al., 2011).
Como as zeínas do milho, o sorgo possui as kafirinas que são prolaminas, um grupo de proteínas de reserva.
Do teor proteico do grão, essas proteínas estão em maior quantidade e são armazenadas dentro de corpos proteicos que contribuem para a sua estabilidade e proteção.
Figura 2. Micrografia eletrônica do endosperma mostrando grânulos de amido (amarelo) e prolaminas (vermelho). Fonte: Adaptado de Black (2001).
FATORES ANTI QUALITATIVOS E TOXINAS
Esses compostos desempenham um papel defensivo para a planta contra aves e patógenos, visto que não há uma proteção física para as sementes, ao contrário da casca do milho, por exemplo. (Magalhães et al., 2001).
Diferentemente dos benefícios que esses compostos proporcionam durante o desenvolvimento da planta, quando ofertados em dietas para animais monogástricos, podem comprometer a digestibilidade impedindo que o animal expresse todo potencial zootécnico nele existente.
Além disso, o ácido fítico pode impedir a digestão ao se ligar diretamente ou indiretamente às proteínas, ao amido e a minerais, como cálcio, ferro, zinco e cobre (Rooney e Pflugfelder, 1986; Liu et al., 2013; Selle et al., 2018) (Figura 3).
Figura 3. Estrutura de um fitato complexado com íons de cálcio (C6H6Ca6O24P6). Fonte: https://pubchem.ncbi.nlm.nih.gov/ compound/24495
Os taninos, por sua vez, consistem em compostos fenólicos que podem interagir e formar complexos com proteínas de reserva dos grãos de sorgo. Este composto pode ser dividido em duas categorias: hidrossolúveis e condensados.
Destes, os condensados são os mais prevalentes e desempenham um papel significativo na baixa digestibilidade do sorgo (Scramin, 2013). Para os animais monogástricos, o tanino provoca efeitos negativos, uma vez que se complexam com as proteínas causando redução na palatabilidade e na digestibilidade do grão. (Pereira Filho e Rodrigues., 2015).
No Brasil, os grãos de sorgo frequentemente exibem contaminação por diversos fungos, resultando em perdas significativas nas esferas sanitária, física e nutricional. |
No processo de deterioração desses grãos, esses fungos têm a capacidade de provocar a degradação de componentes cruciais, como proteínas, açúcares e carboidratos.
Procedimentos adequados de processamento, tais como armazenamento dos grãos e moagem têm o potencial de contribuir para a redução da presença de algumas dessas toxinas promovendo, assim, a qualidade e segurança que a nutrição animal brasileira exige.
UTILIZAÇÃO DO SORGO NA ALIMENTAÇÃO ANIMAL
É evidente que a oscilação nos preços do milho resulta em consideráveis aumentos nos custos de produção de setores dependentes do grão.
Linhagens híbridas têm aprimorado a composição do amido do sorgo, resultando em melhorias na digestibilidade do grão. |
O sorgo ceroso híbrido, é caracterizado por apresentar 100% de amilopectina em sua composição de amido (Zardo e Lima, 1999). Além disso, variedades sem taninos e compostos fenólicos já estão disponíveis no mercado.
Em dietas destinadas a aves e suínos, somente a total substituição do milho pela linhagem sem tanino do sorgo pode ser considerada.
Entretanto, é necessário considerar as diferenças estruturais das ligações entre as fontes de carboidratos e proteínas, bem como o armazenamento desses complexos no grão de sorgo.
A substituição do milho por sorgo granífero pode ser uma alternativa promissora para os monogástricos.
Já estudos com leitões e machos castrados demonstraram que o sorgo pode substituir o milho em até 100% em rações sem prejudicar o desempenho dos animais e a digestibilidade dos nutrientes (Fernandes et al., 2014).
DIGESTIBILIDADE DO SORGO
A digestibilidade do sorgo pode variar dependendo de vários fatores, incluindo a variedade de sorgo, o processamento, a presença de outros componentes na dieta e para qual animal esta dieta será direcionada.
Além disso, a baixa digestibilidade das kafirinas também pode também contribuir para a baixa digestibilidade (Belton et al., 2006).
Outro fator que pode influenciar, é a distribuição das proteínas que cercam os grânulos de amido no endosperma (Sapaterro et al., 2011). No endosperma farináceo, há a presença de grânulos maiores envolvidos por uma matriz proteica descontínua e com uma menor quantidade de proteínas.
Já no endosperma vítreo, os grânulos são menores e a matriz é mais contínua (Paes, 2006). A caracterização das proteínas do sorgo pode dificultar o acesso aos grânulos de amido e, então, reduzir sua digestibilidade.
O cozimento, por exemplo, pode melhorar a digestibilidade das proteínas do sorgo, inativando os fatores anti qualitativos, promovendo a ruptura do corpo proteico e melhorando a solubilidade das proteínas (Nunes, 2000; Margier et al., 2018), além de potencializar a digestibilidade do amido por meio da gelatinização do grânulo.
O uso de xilanases, celulases e glucanases, pode aprimorar a digestão do grão e, também, melhorar o desempenho zootécnico dos animais, como a conversão alimentar em frangos de corte na fase inicial de criação (Leite et al., 2011). Além disso, grãos híbridos são desenvolvidos para aumentar a digestibilidade dos nutrientes (Marques, 2007).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Esse material explorou alguns pontos relacionados ao uso do sorgo na alimentação animal, desde suas características morfológicas e composição nutricional até sua digestibilidade e uso em monogástricos.
Além disso, a utilização do sorgo na alimentação animal revela vantagens econômicas e ambientais, oferecendo uma alternativa rentável ao milho, principalmente em regiões onde o cultivo de milho pode ser desafiador.
Entretanto, é crucial considerar os fatores anti qualitativos e toxinas presentes no grão, os quais podem impactar negativamente a saúde e o desempenho dos animais.
Referências bibliográficas sob consulta. [/cadastrar]