Farinha de resíduo de camarão para frangos de corte
Introdução |
O primeiro passo para utilização de alimentos alternativos é conhecer sua disponibilidade no mercado, sua composição nutricional e energética, a existência de substâncias que possam comprometer o desempenho animal, a digestibilidade dos nutrientes (principalmente aminoácidos), bem como o nível de inclusão capaz de promover o ganho animal.
Dentre os alimentos alternativos existentes, destaca-se, próximo às regiões litorâneas, o subproduto gerado pela produção ou pesca do camarão, conhecido como farinha de cabeça de camarão ou farinha do resíduo de camarão. Este subproduto surge após o processamento para a retirada do filé de camarão, sobrando cabeça, casca e calda (Figura 1).
Experimentação |
Em um dos trabalhos de pesquisa desenvolvidos pelo NEAAVI (Núcleo de Estudos Avançados em Avicultura) foi realizada a caracterização do processo de secagem e a composição nutricional da farinha de resíduo de camarão proveniente da pesca extrativista, bem como estimada a sua energia metabolizável.
Para tal, foi desenvolvida uma plataforma de alumínio de secagem ao sol, com área total de 15 m² e capacidade de secagem de 400 kg do resíduo de camarão. Para proteger as amostras contra insetos e permitir uma ótima ventilação e a passagem de luz solar foi utilizada uma estrutura produzida em cano de PVC (6 x 4 m), coberta com tela plástica com malha 6 x 6 mm e diâmetro de fio de 0,25 mm, semelhante a uma estufa (Figura 2).
A temperatura interna da estufa ficou entre 25 e 47,3ºC e a umidade relativa do ar entre 50,2 e 93,7%, o que possibilitou a secagem do resíduo em torno de 55 horas. Após a secagem, o resíduo composto por 76% de cabeça (encefalotórax) e 26% de casca (exoesqueleto) apresentou um rendimento de matéria seca (MS) de 23%.
Posteriormente foi moído para manter as partículas em 1mm, sendo chamado de farinha de resíduo de camarão (FRC; Tabela 1).
Com as informações nutricionais da FRC, foram avaliados os impactos da inclusão de 0; 50; 100; 150 e 200g/kg de ração para frangos de corte, visando determinar a digestibilidade dos nutrientes e a disponibilidade de energia metabolizável.
O maior (73%) e menor (70,8%) coeficiente de digestibilidade MS foram observados com a inclusão de 100 e 200 g/kg da FRC, respectivamente (Gráfico 1).[registrados]
Foi observada diminuição linear da energia metabolizável das dietas com inclusões crescentes da FRC (Gráfico 2). O declínio de energia, que acompanhou a menor utilização de MS, pode estar relacionada como o aumento da matéria mineral (MM) nas dietas ou com o desequilíbrio nas relações entre os minerais.
De acordo com Shafey (1993) e Adedokun e Adeola (2013), a interação entre os nutrientes da dieta influencia a disponibilidade de energia, bem como o desequilíbrio entre cálcio e fósforo afeta a eficiência alimentar.
No presente trabalho, a inclusão de 50, 100, 150, e 200 g/kg da FRC resultou numa relação de Ca:P de 2,8:1; 3,3:1; 3,7:1 e 3,95:1, respectivamente, e isso pode ter influenciado a utilização da energia da dieta pelas aves.
Embora estudos mostrem que a quitina, um N-acetilquitooligossacarídeo existente no exoesqueleto do camarão seja o responsável pela redução de utilização de nutrientes (Gernat, 2001; Khempaka et al., 2006), há relatos que a quitosana, uma quitina desacetilada:
Assim, no presente estudo, acreditamos que a MM é o componente que prejudicou a digestibilidade das dietas, e não a quitina.
As aves são capazes de digerir aproximadamente 90% da quitosana e quitina (Hirano et al., 1990), sendo o estômago o local de maior digestibilidade, especialmente devido à expressão de mRNA da quitinase ácida a qual aumenta com o consumo de quitina (Tabata et al., 2018).
Isso confirma que o uso de quitina em até 28 g/kg não reduz a digestibilidade ou desempenho dos frangos, como foi observado por Khempaka et al. (2012). No presente estudo foi realizada uma análise de regressão que permitiu estimar a energia metabolizável por quilograma da FRC em 1307 kcal.
A metabolizabilidade da energia pode ser afetada pela idade das aves, composição química e nível de inclusão do ingrediente teste, entre outros fatores (Soares et al., 2005; Bryden e Li, 2010). Por este motivo, é importante conhecer os conteúdos químicos e energéticos dos alimentos, considerando que os produtos de origem animal são pouco padronizados (Gomes et al., 2007). |
Também foi observada redução significativa na digestibilidade ileal de PB e MS com o uso de 150 g/kg da FRC, reafirmando que interação entre nutrientes pode impactar a digestão e absorção (Proszkowiec-Weglarz e Angel, 2013; Akter et al., 2019), indicando a necessidade do nível apropriado de inclusão.
A digestibilidade média de aminoácidos foi de 67,4; 74,8 e 66,7% nos níveis de 50, 100 e 150 g/kg de FRC. Lisina, metionina e fenilalanina (aminoácidos essenciais) e ácido glutâmico, ácido aspártico e alanina (não essenciais), apresentaram os maiores coeficientes de digestibilidade ileal, enquanto treonina e glicina apresentaram os valores mais baixos.
Conclusões |
A FRC possui características nutricionais desejáveis, podendo ser utilizada em dietas para frangos de corte. Sugerimos o nível de inclusão de 100 g/kg de dieta ou 10% para alcançar a melhor digestibilidade de nutrientes e metabolizabilidade da energia (1.307 kcal de EM/kg com base na MS).
https://doi.org/10.1016/j.anifeedsci.2020.114467.[/registrados]