E isso está diretamente relacionado com a sanidade de plantéis. Diversas são as premissas que sabemos que devemos seguir para evitar que eles sejam acometidos por doenças. Entre elas, está seguir os quatro pilares da produção avícola: cuidados com a nutrição, com o manejo (arraçoamento, seleção de ovos e aves), com a sanidade (medidas de biosseguridade, imunização dos lotes, monitorias, foco na qualidade de água) e com a ambiência (bem estar animal).
Decisões essas que podem envolver perder parte da produção, ou tratá-la com antibióticos, que oferecem uma solução imediata, mas que contribuem para a manutenção de pintos de baixa qualidade — lembramos que um dos maiores problemas atualmente nas granjas é a mortalidade inicial por onfalite — e para a resistência antimicrobiana (que já tratamos aqui), um problema de grande relevância à saúde pública.
O que fazer para evitar que esse cenário se crie? Tomando medidas preventivas que começam ainda no período de pré-eclosão. Vou detalhar melhor a seguir.
Por que ter cuidados ainda durante a pré-eclosão?
O pinto de um dia carrega consigo todas as características genéticas da sua linhagem e das condições em que ele foi incubado. Em outras palavras: ele é reflexo da incubação, do sistema de produção das matrizes, do
E como reverter essa questão? Por onde começar? Em recente treinamento para a equipe interna de representantes da Biocamp, reuni alguns dos caminhos para isso e vou contar a seguir. Já adianto o primeiro deles: entender a importância da cloaca das aves.
Cloaca
A cloaca de uma ave tem múltiplas funções e pertence a três sistemas: digestivo, excretor urinário e reprodutor. Isso significa que agentes saprófitas, oportunistas ou patógenos presentes em qualquer um dos segmentos desses sistemas poderão chegar até ela e, então, contaminar qualquer estrutura do ovo: gema, clara, membrana interna ou externa, e a casca do ovo.
Qual ação tomar a partir desta constatação? Iniciar tratamentos para inibir doenças? Minha orientação é analisar antes de agir.
O trabalho mostra a variedade de bactérias saprófitas que estão presentes no oviduto, na cloaca, na casca do ovo, na clara e no próprio embrião. A questão é que, em situação de equilíbrio, sua presença traz benefício para a ave.
Outro exemplo da presença benéfica de uma bactéria está na E. coli no trato intestinal inferior, que inibe o crescimento de outras bactérias, como a Salmonella. A última edição do Diseases of Poultry (2020) mostrou que em aves normais, entre 10 a 15% dos coliformes intestinais podem pertencer a sorotipos potencialmente patogênicos. A E. coli no trato intestinal consiste, portanto, em um reservatório de fatores de virulência e resistência antimicrobiana. E o que deve ser feito? Nada! Tentar destruí-los com o uso de antibióticos é também reduzir os outros 85% que não são patogênicos.
Uso de antimicrobianos
i) desequilíbrio da microbiota intestinal (disbiose) e
ii) criar condições favoráveis para seleção de bactérias resistentes.
Geralmente as principais patologias aviárias e outras afecções, que com maior frequência afetam aves de reprodução, sujeitas a tratamento com antimicrobianos (AMCs) — ou onde seu uso é praticado de forma preventiva e frequente— são:
- Problemas entéricos causados por C. perfringens ou C. colinum, associados ou não à coccidiose;
- Colonização do trato digestivo das reprodutoras por salmonelas paratíficas, transmitidas verticalmente à sua progênie;
- Onfalites (pintos de um dia) e “ovos bomba” (nos incubatórios), contaminados geralmente por bactérias, oportunistas ou não, tais como Pseudomonas aeruginosa e/ou Escherichia coli (APEC);
- Síndromes respiratórias nas aves.
Quando isso acontece, os antibióticos reduzem a presença de bactérias saprófitas propiciando o aumento do nível, da concentração e da intensidade de bactérias patogênicas.
É por isso que os matrizeiros precisam ter mais atenção e controle no período pré-eclosão: para que não haja perda de 0,5 a 1% do lote já no primeiro dia e para que os demais pintos, após o tratamento, não sejam apenas “sobreviventes ao processo”.
O papel dos profissionais do setor
Para se ter ideia, 50% dos frangos europeus estão contaminadas com patógenos resistentes aos antibióticos* e 35% contém patógenos resistentes a antibióticos importantes para a saúde pública.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) já fez um alerta: em 2050 haverá mais pessoas morrendo de infecções por bactérias multirresistentes a antibióticos que de outras doenças. Tudo indica, conforme estudos, que essa será a próxima “pandemia” que viveremos.
Será um problema de saúde que poderá matar até 10 milhões daqui 30 anos. Mas, ao contrário da pandemia da Covid-19, que pegou a todos desprevenidos, ainda é tempo para agir e mudar esse cenário.
Em tempos em que programas como ESG (governança, ambiental e social) estão cada vez mais em evidência e já são exigência do nosso mercado, aqueles que não se adequarem a essas questões irão ter dificuldades de colocação de seus produtos e, até mesmo, desaparecer.
Por isso, precisamos adotar cada vez mais novas políticas e pensar em ferramentas que mostrem efetividade, sejam interessantes e capazes de modular a microbiota intestinal de maneira a não tornar as bactérias super resistentes.
Os probióticos são um dos caminhos para isso. As bactérias probióticas de uma ou mais espécies fazem a colonização ainda na reprodutora e no período pré-eclosão e ajudam a reduzir o crescimento das patogênicas que podem provocar enfermidades. Os clientes que já aderiram à iniciativa, inclusive, já apontaram aumento de produtividade e diminuição dos custos — em especial com medicamentos.
Enquanto nós não decidirmos definitivamente ampliar uso de probióticos na recria e reprodução de reprodutoras, sejam elas matrizes ou avós, vamos continuar favorecendo essa cadeia. E o frango de corte também deveria passar pelo mesmo processo.
Qual futuro você quer para o seu negócio?