Situação global do milho preocupa e Brasil pode ser pressionado para exportar
A situação global quanto à oferta de milho é preocupante em razão da guerra entre Rússia e Ucrânia, disse o coordenador do Insper Agro Global, Marcos Jank, em palestra realizada nesta terça-feira (05/04), no Simpósio Brasil-Sul de Avicultura, promovido pelo Núcleo Oeste de Médicos Veterinários e Zootecnistas (Nucleovet).
Jank disse que no Brasil houve duas quebras importantes de safra de milho, em 2017/18 e em 2020/21, ao mesmo tempo em que o mundo está precisando cada vez mais do grão. E, agora, com a guerra na Ucrânia, a pressão exportadora de milho pode recair sobre o produto brasileiro.
“A Ucrânia é o quarto maior exportador global de milho. E o que se espera é uma quebra de safra de no mínimo 50% no país por causa da guerra”, afirmou Jank, acrescentando que as regiões produtoras de milho na Ucrânia são justamente as que estão no centro do conflito com a Rússia. “Todas as notícias são preocupantes; se faltar milho ucraniano, o preço sobe e o Brasil vai sofrer pressão exportadora.”
Para o especialista, trata-se de uma situação “bastante preocupante”, porque a guerra está afetando principalmente os grãos, sendo que prejudica dois dos três principais cereais consumidos globalmente: trigo(do qual a Ucrânia também é grande produtor e exportador) e milho.
“Um total de 40% da ingestão de caloria global é representado por arroz, trigo e milho”, disse Jank.
Autossuficiência russa
Segundo ele, “a Rússia partiu, há alguns anos, em busca da autossuficiência na produção de alimentos, carnes e grãos, e pode, no médio prazo, se tornar concorrente do Brasil na exportação desses produtos”.
“A Rússia está sendo estimulada pelos chineses a produzir soja, e eles já produzem oito milhões de toneladas. Ainda é pouco, mas estão buscando autossuficiência”, afirmou Jank. “Então eu acho que os russos vão entrar no que nós, no Brasil, já fazemos hoje, que é (a exportação no) complexo grãos e carnes. E eles vão ser grandes nisso”.
O palestrante avaliou que o Leste Europeu é a região que mais ameaça o agronegócio brasileiro no futuro.
“Não sei como vai ser o desenrolar da guerra (entre Rússia e Ucrânia), mas já havia, antes do conflito, um processo de aumento de autossuficiência da Rússia e no Leste Europeu e essas regiões tendem a ser exportadoras”, disse ele, concluindo que, desta forma, o mercado brasileiro não vai mais estar na Rússia.
“A Rússia não será mais compradora dos nossos produtos; será nossa concorrente. Nossos mercados estarão na China, no leste da Ásia, na África.” Logística
Jank afirmou ainda que “a situação da logística e do escoamento da produção agropecuária no Brasil melhorou bastante nos últimos anos, mas o País ainda deve pensar estrategicamente a respeito deste assunto, sobretudo em relação às ferrovias”.
Segundo ele, “atualmente, tudo o que está sendo feito em ferrovias no Brasil é voltado à exportação de grãos, com projetos concentrados no Centro-Oeste. Mas e o Rio Grande do Sul e o Paraná?”, indagou o especialista, acrescentando que, justamente sob este aspecto, a questão estratégica é importante, já que o Sul do País é importante produtor de proteína animal e precisa de grãos.
“É essencial pensar como melhorar o provisionamento de grãos na região Sul e fazer com que não falte produto para lá, porque, quando falta, é necessário trazer milho da Argentina e de outros países.”
Estratégia
Jank disse também que, de qualquer maneira, as “ferrovias vão acontecer” e que “os projetos estão andando”, o que é muito bom. “Mas tudo isso está sendo resolvido em direção ao porto, enquanto o Sul também precisa de grãos para crescer. Então é necessário se pensar numa estratégia.”
Por fim, o coordenador do Insper Agro Global questionou se o que o Brasil vai vender no porto é o que o mundo quer ou o País “terá uma estratégia um pouco mais sólida”, de saber o que o próprio País quer, “inclusive da China”.
Nesse contexto, Jank criticou o pensamento de curto prazo do Brasil e o comparou às políticas chinesas, que são traçadas para 50, 100 anos. “Nós somos curto-prazistas, pensamos para os próximos seis meses ou para o político ganhar eleição.”