Streptococcus suis, causador da meningite estreptocócica, como enfrentar esse desafio?
O agente Streptococcus suis é um dos patógenos com maior relevância nas criações tecnificadas de suínos, causando altos prejuízos econômicos às granjas em todo o mundo.
Apresenta 35 sorotipos, nem todos com a mesma patogenicidade. A maioria dos isolados pertencem aos sorotipos 1 a 9. No Brasil, o sorotipo 2 foi o mais isolado entre amostras de animais clinicamente doentes (Sobestiansky et al, 2007).
Além disso, também é um agente zoonótico (essencialmente sorotipo 2), considerado na maioria dos países da OCDE como uma doença ocupacional dos trabalhadores de granjas suinícolas.
A complexidade desta patologia requer, portanto, uma análise multifatorial, discutida abaixo.
Etiologia
Os estreptococos são patógenos conhecidos em todas as espécies.
Como agente secundário, pode causar complicações, como necrose de orelhas e cauda, e pneumonia tromboembólica.
De acordo com Flores et al., 1993, o mesmo suíno pode ser colonizado por diferentes sorotipos simultaneamente.
Epidemiologia
S. suis é um colonizador do trato respiratório superior dos suínos, invadindo as vias aéreas e amígdalas muito precocemente, através do canal do parto. O agente pode ficar aí alojado por muito tempo, sem a manifestação de sinais clínicos.
- 100% dos leitões são colonizados, embora nem todos por sorotipos patogênicos (Cloutier, 2003). Os maiores índices de mortalidade (frequentemente súbita) ocorrem na fase de creche e recria.
Sorotipos como o 9 apresentam importância crescente, particularmente em alguns países da Europa Ocidental. No Brasil, em um estudo em animais de 41 a 90 dias de vida, onde foram analisadas 323 amostras, 61% pertenciam ao sorotipo 2, 19,8% eram amostras não sorotipadas e 6,8% eram do sorotipo 1. Foram encontrados também outros sorotipos, de 3 a 9 (Sobestiansky et al 2007).
A transmissão direta pode ser horizontal, nariz a nariz (e possivelmente fecal-oral), ou vertical (intravaginal). Também pode haver transmissão indireta por equipamentos (cochos e bebedouros), e fômites, como roupas, seringas, fezes, água, poeira e outros animais (roedores e moscas).
Como patobionte bem adaptado, o Streptococcus suis tem duas apresentações:
Ferrando e Schultz (2016) propõem um modelo hipotético de infecção in vitro em células epiteliais humanas e suínas, onde demonstram a translocação de cepas patogênicas do sorotipo 2 através do trato gastrointestinal. Portanto, S. suis deve ser considerado um patógeno emergente, transmitido por alimentos.
Após romper as barreiras mucosas (respiratórias, intestinais) ou cutâneas, o S. suis invade diversos órgãos e tecidos por disseminação hematogênica e/ou linfática, produzindo meningite, artrite ou outras patologias sistêmicas (como choque séptico com óbito, poliserosite e endocardite).
Durante a disseminação sistêmica, o Streptococcus suis tem diferentes mecanismos para resistir ao ataque do sistema imunológico do hospedeiro: prevenindo a fagocitose, induzindo a síntese de citocinas inflamatórias etc.
Diagnóstico
É feito com base nos sinais clínicos (febre, movimentos de pedalagem, opistótono, vocalização intensa), lesões macroscópicas (em cérebro, coração e articulações) e idade.
Diagnóstico diferenciando outras doenças como Aujesky, polioencefalomielite, doença do edema, doença de Glasser, listeriose e intoxicação por cloreto de sódio, deve ser feito.
A confirmação é obtida por diagnóstico laboratorial com base no isolamento e identificação do agente infeccioso e por histopatologia dos tecidos afetados.
Amostras de líquido cefalorraquidiano ou animais saudáveis e não tratados devem ser coletados, a partir de 3 lotes diferentes. Swabs amigdalianos ou nasais não são recomendados, pois o S. suis é um habitante normal nesses locais e o isolamento tem sensibilidade muito baixa. A sorotipagem é importante para identificação do sorotipo predominante.
Controle
Diante de um processo estreptocócico, devemos nos fazer duas perguntas:
- O Streptococcus suis é um patógeno primário em minha granja?
- Se não é, como posso controlar o que o faz aparecer?
A partir daqui, abordaremos o controle a partir de dois pontos de vista:
- 1 – Prevenir o S. suis, um colonizador precoce da mucosa, que acaba se transformando em um agente altamente patogênico invasivo.
- 2 – Minimizar o risco de zoonose, no caso do sorotipo 2.
Uma vez diagnosticado, o controle envolve a redução dos fatores, contando com sete pilares fundamentais:
- 1 – Controle dos principais patógenos:
Vírus ou bactérias patógenas existentes na granja.
- 2 – Biossegurança:
Sistema de gestão McREBEL (McCaw et al 1996).
- 3 – Limpeza e desinfecção:
Superfícies limpas, desinfetadas e secas; a maioria dos desinfetantes é muito eficaz: hipoclorito de sódio, formaldeídos, glutaraldeídos, desinfetantes iodados, etc.
Secagem e pré-aquecimento das salas antes da introdução das fêmeas;
Ausência de biofilmes nas tubulações de água;
Controle de moscas e roedores.
- 4 – Gestão e controle ambiental nas salas de parto:
Ambiente limpo e temperatura correta: 18-22°C na área da porca e 28-34°C na área de descanso dos leitões;
Evitar o excesso de umidade e poeira;
Ventilação adequada;
Práticas corretas de colostro (consumo mínimo por leitão de 250 g nas primeiras 24 horas de vida).
- 5 – Manejo e controle ambiental no desmame:
Temperaturas entre 28°C na semana após o desmame e24°C no final da transição
Velocidade máxima do ar: 0,15 m/s
Evitar poeira e gases tóxicos: NH3, CO2
Densidade adequada: mínimo 0,2 m2 por leitão
Evitar estresse social fornecendo material manipulável e com desenho correto das baias (áreas de comer, brincar, descansar e defecar)
Água com qualidade.
- 6 – Tratamento:
A antibioticoterapia em surtos agudos é indicada. Drogas como Amoxilina e cefalosporinas tem demonstrado alta eficiência no tratamento.
O tratamento com antibióticos não elimina a condição de portador assintomático.
Alguns especialistas defendem o uso de anti-inflamatórios juntamente com antibióticos (básico na meningite).
- 7 – Medidas preventivas:
Vacinação: vacinas comerciais e autovacinas, com resultados muito diferentes. Para o futuro, as vacinas vivas atenuadas, colostrais e de subunidades heterólogas com Opsonização Ag.
Evitar brigas no pós-desmame para prevenir infecções transcutâneas: classificação correta por tamanhos, gestão de materiais manipuláveis, socialização antes do desmame etc.
Substituir o corte dos dentes (quando realizado) pelo lixamento superficial, e no nascimento realizar o corte e desinfecção do umbigo.
Trabalhar a saúde digestiva: controlando a microbiota e a integridade da barreira intestinal.
Utilização de piso vazado e não abrasivo na maternidade a fim de evitar lesões de pele e articulações.
Uso de alfa-monolaurinas para controle de S. suis
Os ácidos graxos de cadeia média e seus derivados apresentam efeito antimicrobiano, de duas maneiras:
Alfa-monoglicerídeos, e especialmente α-monolaurina (monoglicerídeo de ácido láurico), são uma ferramenta poderosa para reduzir ou substituir antibióticos na produção animal.
A α-Monolaurina tem uma ação muito maior contra Gram positivas do que o próprio ácido láurico. Este tipo de monoglicerídeo é hidrodispersível, e capaz de passar para a corrente sanguínea em sua forma original, sem ser atacado pela lipase pancreática, quando devidamente microencapsulado e não dissociado (Cos Quixal Porcinews, 2017).
Funciona dissolvendo a camada de peptidoglicano da parede celular das bactérias Gram positivas e penetrando no citoplasma, causando a lise da membrana. Uma vez no citoplasma, a α-monolaurina pode bloquear a expressão de toxinas e fatores de virulência.
Da mesma forma, pode atuar desestabilizando o capsídeo lipídico de certos vírus.
Além disso, pode acumular-se no colostro da porca, de modo que a suplementação desse aditivo na alimentação da porca antes do parto produz um colostro com maior concentração e percentual de gordura. Suplementado durante a lactação, proporciona um maior nível de ácido láurico no leite.
Conclusões
S. suis causa perdas importantes no setor suinícola, além de zoonoses (sorotipo 2).
Como colonizador precoce e patobionte bem-sucedido, a abordagem da doença deve ser multifatorial.
Referências sob consulta.