Microbiota intestinal e sua modulação através da dieta em cães
A microbiota presente no trato gastrointestinal é composta por uma ampla diversidade de microrganismos, incluindo bactérias, vírus, fungos e protozoários (Suchodolski, 2021). Essa comunidade microscópica desempenha um papel fundamental no funcionamento do organismo e na manutenção da homeostase do hospedeiro.
Cada filo possui preferência específica por substratos para a fermentação, resultando na produção de diversos metabólitos, os quais podem ter efeitos benéficos ou adversos.
Por outro lado, alguns compostos podem ser tóxicos para a mucosa, como algumas aminas biogênicas, amônia e fenóis, prejudicando o ambiente intestinal e por sua vez, interferindo na qualidade fecal (Garrigues et al., 2022).
Dessa forma, quando a microbiota está em eubiose (equilíbrio), exerce um impacto direto nas funções do organismo, proporcionando suporte ao sistema imunológico (Arpaia et al. 2013; Suchodolski, 2016). No entanto, esse equilíbrio pode ser perturbado por diversos fatores, como:
(Schmidt et al., 2018; Vilson et al., 2018; Pilla et al., 2020).
Com base nisso, será abordado a seguir as principais bactérias relacionadas à saúde intestinal de cães e como a dieta pode auxiliar na sua modulação.
Bactérias sentinelas do trato gastrointestinal
A disbiose é caracterizada pela modificação e redução da diversidade microbiana no intestino, além de alterações na proporção de alguns microrganismos (Barko et al., 2017).
Os pesquisadores identificaram 7 bactérias sentinelas, ou seja, microrganismos sensíveis a mudanças na homeostase intestinal, capazes de indicar um microbioma em eubiose ou em disbiose (Tabela 1).
Dessa forma, bactérias do gênero Faecalibacterium, Turicibacter, Blautia, Fusobacterium e Clostridium hiranonis encontram-se aumentadas em cães saudáveis, enquanto Escherichia coli e Streptococcus encontram-se diminuídas.
Em contrapartida, em animais com alguma enteropatia crônica ocorre o inverso, sendo Escherichia coli e Streptococcus encontrados em maiores quantidades.
Tabela 1: Bactérias sentinelas do trato gastrointestinal e os principais metabólitos produzidos
As bactérias do gênero Turicibacter, apesar de produzirem lactato em quantidades mínimas (Bosshard, Zbinden e Altwegg, 2002), desempenham um papel importante na regulação da produção de serotonina no intestino, contribuindo para a motilidade intestinal, e evidenciando a importante ligação entre o eixo intestino-cérebro (Vedovato et al., 2015; Fung et al., 2019).
Apesar de o gênero Fusobacterium, pertencente ao filo Fusobacteriota, estar associado a câncer colorretal em humanos (Goradel et al., 2018), esse gênero foi encontrado em maiores quantidades em cães saudáveis (Suchodolski et al., 2008; AlShawaqfeh et al., 2017).
Ainda, o Fusobacterium, beneficiando-se da fermentação proteolítica, produz butirato, que, além de ser fonte de energia para as células intestinais, exibe efeitos anti-inflamatórios (Louis e Flint, 2016).
Embora algumas espécies do gênero Clostridium possam causar problemas no hospedeiro, como Clostridium difficile (Martin, Monaghan e Wilcox, 2016), a espécie Clostridium hiranonis proporciona benefícios.
Além disso, os metabólitos por elas produzidos, como as concentrações fecais de alguns AGCC, ácidos biliares primários e secundários e calprotectina, também podem ser utilizados como biomarcadores de saúde intestinal canina.
Efeito da dieta sobre a modulação da microbiota
Além disso, observa-se crescente inclusão de ingredientes direcionados a modulação do microbioma intestinal, como prebióticos e probióticos.
Ingredientes fundamentais, como fontes de proteínas e fibras, exibem notável capacidade de modular a microbiota intestinal dos cães. |
No estudo conduzido por Kaelle et al. (2023), a utilização de grãos secos de destilaria com alto teor proteico (HPDDG) resultou em efeitos benéficos na modulação da microbiota, incluindo a redução do gênero Streptococcus.
Da mesma forma, a pesquisa realizada por Souza et al. (2021) destacou que a modulação da microbiota intestinal de cães pode variar conforme o tipo de fonte fibrosa empregada.
Enquanto fibras insolúveis, como a celulose, resultaram em menor capacidade de modulação da microbiota dos cães. |
Tais efeitos incluem menor abundância relativa de Streptococcus e menor concentração sérica de NF-kB (fator nuclear relacionado a inflamação).
Além disso, a suplementação com este microrganismo resultou em aumento do ácido propiônico e redução do odor fecal e de compostos nitrogenados, como as aminas biogênicas em cães (Bastos et al., 2020).
Considerações finais
Dietas contendo proteínas de alta digestibilidade e fibras solúveis parecem melhorar o perfil do microbioma intestinal e seus metabólitos, aumentando bactérias relacionadas à eubiose e AGCC e reduzindo bactérias com potencial patogênico e compostos putrefativos.
Além disso, uma dieta enriquecida com aditivos como probióticos e óleos funcionais, pode ser interessante para melhorar a eubiose e a saúde e o bem-estar dos cães.
Referências bibliográficas sob consulta junto ao autor. [/cadastrar]