Nutrição micromineral e oportunidades na aquacultura do século XXI

Estando nos Emirados Árabes, possivelmente você se surpreenderia se alguém lhe convidasse para se deliciar de um suculento e fresco salmão produzido ali em Dubai.  Isso mesmo, um animal típico de regiões frias do planeta, cultivado em instalações moderníssimas, no meio das areias do deserto, em um país que tem em média 45 o C de temperatura.  

O mesmo poderia acontecer consumindo um prato confeccionado à base de camarão com genética tailandesa, cultivado em uma greenhouse em Amsterdam, ou outro peixe qualquer, criado em tanques ao redor de bairros de Nova York. 

Na aquacultura mundial as modernas técnicas de produção fazem com que todos os limites geográficos sejam superados, pois a pesquisa aplicada propicia que todas as espécies sejam criadas em qualquer onde a tecnologia esteja livre, científica e economicamente, gerando esses curiosos cenários.

Mantidas as devidas proporções e, obviamente, com cálculos de retorno econômico bem ajustados, pode-se avançar muito em instalações onde é possível obter simulações quase que perfeitas de ambientes naturais de criação, que vão desde a luminosidade do nascer e pôr do sol, até as variações de temperaturas de águas profundas e correntes marinhas típicas de países de águas frias como da Noruega, Chile, Islândia e Canadá.

Se olharmos para um passado não muito distante, vamos nos deparar com diversas dificuldades na criação dos animais aquáticos.

Ao mesmo tempo que coisas boas surgiram, como as limitações regionais sendo desconstruídas, com a criação de espécies diferentes do seu local de origem; a intensificação de produção, a comercialização e a melhoria da qualidade da vida das comunidades envolvidas, também tivemos que enfrentar grandes desafios.

Sem o conhecimento necessário, as criações estavam frequentemente susceptíveis a surtos de doenças que podiam facilmente devastar produções inteiras e trazer o caos sanitário e socioeconômico às regiões rapidamente.

Não é por acaso que a aquacultura teve uma taxa de crescimento de 30% nos últimos 20 anos, sustentando diretamente 600 milhões de pessoas no mundo todo. A aquacultura não se restringe mais apenas à captura de animais e, sim, à produção intensiva (FAO 2022).

A exemplo de outras espécies, a nutrição sempre andou lado a lado com as evoluções nos processos de produção e novos desafios e oportunidades continuam surgindo.

Preponderantemente observamos que o perfil proteico e energético das dietas e suas relações são razoavelmente conhecidos, contudo outras variáveis representam um desafio cada vez maior para o nutricionista e o produtor:

• A manutenção equilibrada desses dois nutrientes para que não se tenham perdas de performance aliado a restrição de ingredientes de origem animal;
• A busca de alternativas de fontes nutritivas;
• A sustentabilidade;
• A resposta imune adequada e
• O bem-estar animal com o controle do stress.

A nutrição micromineral pode ajudar muito na manutenção desse equilíbrio e os bons resultados consistentes estão surgindo cada vez mais.

O consumo de ingredientes de origem animal como óleos e as farinhas de subprodutos nas dietas de aquacultura sempre foi uma preocupação, tanto pela sua limitação de uso, quanto pelo aspecto de sustentabilidade.

As dietas modernas já migraram rapidamente para perfis mais vegetais e sustentáveis ao mesmo tempo que têm trazido uma considerável economia aos produtores. Contudo, isso também traz um grande desafio aos nutricionistas e aos animais, visto que uma concentração maior de fatores antinutricionais, a digestibilidade e biodisponibilidade em geral dos nutrientes limita o uso maior de fontes alternativas de ingredientes.

A redução de ingredientes de origem animal como a farinha de peixe demonstra que a partir de um determinado nível temos o comprometimento de oferta de Zinco e Selênio, podendo impactar significativamente no desempenho dos animais.

O uso do micromineral Cromo em sua forma trivalente ligado a aminoácidos favorece a mobilização de tecidos graxos e o aporte de energia às células, facilitando a adaptação dos animais às dietas modernas com manutenção de performance e ganho econômico.

Exemplos como esse demonstram que microminerais podem ter impacto no metabolismo intermediário animal, ocasionando o maior aproveitamento da dieta a nível tecidual, com uma eliminação menor de nutrientes no ambiente, inclusive o Fósforo.

• Isso é extremamente relevante pois o controle desse mineral (P) é uma das grandes preocupações na nutrição aquática atualmente.

Quando falamos em tecnologia da carne (qualidade do produto) é fundamental que tenhamos atenção aos processos oxidativos e perdas de qualidade – ou surgimento de características indesejáveis ao mercado.

O bom aspecto geral e a coloração dos animais são culturalmente fatores determinantes na aceitação do consumidor e indicativo de frescor do produto. Sabemos que a cor da carne é devida, principalmente, ao estresse químico dos pigmentos, como a mioglobina (músculo) e hemoglobina (sangue). O Ferro da mioglobina em contato com o oxigênio é responsável pela alteração na cor.

Com isso os microminerais envolvidos em processos antioxidantes como Zn, Mn, Cu, Fe e Se têm um papel muito importante na preservação de pigmentos naturais utilizados nas dietas e quando associados a minerais complexados a aminoácidos, podem ter o seu uso reduzido com igual ou melhor pigmentação do produto final.

Além disso, também por ação direta preservativa das membranas celulares, os microminerais acabam gerando menores perdas por gotejamento (drip loss) ou pós descongelamento (tawloss), impactando tanto no rendimento da indústria, quanto no shelf life do produto final.

O Ferro inorgânico é um micromineral contaminante comum de diversas dietas e muitas vezes está presente em grande quantidade na ração, principalmente onde há muitos ingredientes de origem animal adicionados. Apesar disso, muitas vezes o nutriente também é suplementado.

Cada vez mais sabemos que o Ferro tem poder pró-oxidante, além de promover a multiplicação bacteriana, principalmente de patógenos na luz intestinal.

O uso de fontes de Ferro complexadas a aminoácidos reduz a disponibilidade do nutriente no intestino dos animais, evitando processos inflamatórios ao mesmo tempo que propicia de maneira mais eficiente a melhoria no perfil nutricional, refletindo em um ganho de peso superior (biomassa).

O banimento do uso de antibióticos na aquicultura vai ao encontro do que se compreende como produção sustentável, já que os consumidores rejeitam a ideia de ter em sua mesa alimentos que possam veicular essas moléculas.

A redução ou o uso minimizado desses recursos terapêuticos de produção são continuamente buscadas através de investimentos em tecnologias como o RAS (Sistema de Recirculação de Água), para citar um exemplo, onde se tem enorme controle de patógenos circulantes nos sistemas fechados de criação.

Sabemos que uso de microminerais tem um reconhecido papel na saúde animal, pois estão diretamente envolvidos:

• Na manutenção de mecanismos de controle de stress de qualquer origem;
• Na redução da inflamação seja qual for a fonte (inclusive nutricional);
• Na regeneração tecidual como epitélios em geral, tecidos queratinizados como escamas e pele;
• Na produção de muco e
• Na imunomodulação.

Dentre os microminerais, um dos mais importantes é o Zinco que, além de fazer parte de mais de 300 enzimas, tem papel fundamental como suporte nutricional em tecidos com alto turn over e multiplicação celular. A molécula de Zinco complexada a aminoácido apresenta grande potencial protetivo, dificultando a adesão de ectoparasitas como Caligus rogercresseyi (piolho de salmão) e facilitando a sua rápida cicatrização, com reflexo na performance dos peixes.

Desafios virais e bacterianos também são responsivos à suplementação com o micromineral Zn complexado, pois tem papel fundamental na multiplicação de células do sistema imune, facilitando a sua rápida e mediada resposta contra patógenos como bactérias do gênero Streptococcus.

Muitas vezes observamos que problemas de performance em campo podem ser contidos ou minimizados pela nutrição de alta performance dos reprodutores. A estratégia de transferência de nutrientes para a prole via progenitores é muito utilizada em todas as espécies, e em geral observamos excelentes resultados tanto a nível de desempenho em campo, quanto em uma visão de estratégia nutricional para os próprios reprodutores, pois ao mesmo tempo preservamos os peixes ciclo após ciclo, prorrogando a sua exaustão reprodutiva.

O investimento em reprodutores com foco em qualidade da progênie é muitas vezes irrisório, visto que a população-alvo envolvida é muito pequena comparada à progênie.

Micromineral complexado a aminoácidos tem alta capacidade de transferência, que pode ser observado pela melhor constituição de matrizes orgânicas colagenosas e, posteriormente, também ósseas.

Essa estratégia tem grande reflexo na melhoria da qualidade de ovos em fases precoces de vida, refletindo na progênie maior resistência a desafios que virão, como os ambientais e de manejos necessários.

Apesar da aquacultura estar em rápida e constante evolução, novos desafios e oportunidades surgem diariamente.

Através da melhoria constante da performance, os animais têm demonstrado quais são os seus reais requerimentos. E o uso de microminerais complexados a aminoácidos se apresenta como uma grande ferramenta dietética para garantirmos a produção dentro das regras que o mercado consumidor nos impõe diariamente, focando sempre na sustentabilidade e em segurança alimentar, inclusive a nível mundial.