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Conheça os benefícios dos aditivos fitogênicos para melhorar a eficiência alimentar de vacas leiteiras
INTRODUÇÃO
A produção de leite deve enfrentar vários desafios para os próximos anos. Dentre eles, é possível destacar as reduções na emissão de amônia, metano e no uso de antibióticos. Por outro lado, estudos têm sido desenvolvidos com o objetivo de melhorar os cuidados em relação ao bem-estar dos animais, uma vez que têm influência direta na qualidade da carne e leite de ruminantes.
Diante desses desafios, o uso de antibióticos tem sido um dos temas mais questionados na produção animal. Essa preocupação crescente ao longo dos anos é atribuída a possível
contribuição desses compostos com a produção de resíduos ou resistência bacteriana, o que pode representar risco à saúde humana (Vendramini et al., 2016; Santos et al., 2019).
Dessa forma, nos últimos anos, estudos têm sido desenvolvidos com o objetivo de explorar métodos alternativos que promovam modificações favoráveis no metabolismo ruminal com a finalidade de melhorar a eficiência alimentar e a produtividade animal.
Apesar dos benefícios descritos do uso de antibióticos na produtividade animal, tanto em relação ao crescimento e eficiência alimentar em ruminantes e animais monogástricos, com o passar dos anos, tem sido considerado uma preocupação e risco à saúde humana pela União Europeia.
Diante disso, através desse órgão foi introduzida uma recente legislação (Regulamento 1831/2003/CE) com o objetivo de proibir o uso cotidiano de promotores de crescimento na alimentação animal.
Extratos de plantas contém uma grande variedade de compostos orgânicos, como os óleos essenciais, que segundo descrito na literatura científica apresentam propriedades e atividades antimicrobianas que os tornam alternativas potenciais em substituição aos antibióticos na manipulação da atividade microbiana no ambiente ruminal (Rhodes, 1996).
Diante disso, ao longo dos últimos anos, estudos têm sido realizados com o objetivo de avaliar a suplementação de extratos de plantas em dietas para vacas leiteiras, com resultados variáveis possivelmente devido à variabilidade da natureza dos compostos químicos presentes nestes extratos.
Os óleos essenciais podem ser encontrados em diferentes partes das plantas, incluindo o caule, pétalas, flores, folhas, frutos.
Apesar disso, as concentrações desses compostos dentro das plantas podem ser influenciadas por diferentes fatores tais como o estádio de desenvolvimento da planta, ou fatores ambientais como incidência de luz, temperatura.
Apesar da variação das concentrações de óleos essenciais dentro das plantas, diversas análises possibilitam a determinação do teor de moléculas ativas nos ingredientes, de forma a ter uma boa repetibilidade da eficácia desses aditivos.
O uso de pós e extratos vegetais padronizados em moléculas ativas define um aditivo fitogênico.
Sendo assim, vários fitoquímicos bioativos podem ser usados como potenciais alternativas “naturais” aos aditivos “químicos” para favorecer a modulação da fermentação ruminal e do desempenho animal.
OS ÓLEOS ESSENCIAIS (OE)
Apresentam uma grande variedade de ação antimicrobiana, embora seja descrito efeito mais potente nas bactérias Gram-positivas em comparação às Gram-negativas.
Além disso, fungos, protozoários e vírus também podem ter seu desenvolvimento comprometido através dos mesmos efeitos biológicos que os OE causam nas populações bacterianas no ambiente ruminal.
Conforme relatado por Calsamiglia et al. (2007), os OE além de terem o potencial de modificarem os parâmetros de fermentação ruminal, a depender da dose utilizada podem também promover mudanças no metabolismo ruminal do nitrogênio (N) e diminuir a degradação proteica ou a produção de amônia no rúmen.
Dessa forma, a inclusão de OE nos sistemas produtivos está associada com efeitos benéficos, pois permitem o melhor aproveitamento de N das dietas resultando na diminuição dos custos com alimentação.
Além disso, exercem efeito benéfico no metabolismo proteico dos animais pois podem reduzir a excreção de N e, consequentemente, diminuir a poluição ambiental associada com a produção de ureia e amônia.
AS SAPONINAS[registrados]
São compostos presentes em diferentes partes das plantas, conhecidas por terem uma atividade específica sobre os protozoários, formando complexos com o colesterol da membrana celular. Em decorrência disso, diversos efeitos biológicos devido ao uso de saponinas têm sido descritos, que de forma geral estão comumente relacionados com seus modos de ação sobre as membranas celulares.
Dessa forma, esses compostos têm o potencial de afetar a permeabilidade das membranas dos protozoários ruminais, e promoverem modificações nos parâmetros da fermentação ruminal, com consequentes efeitos benéficos no desempenho produtivo dos animais (Wang et al., 2019).
Diante dos benefícios descritos sobre o uso de óleos essenciais em dietas para ruminantes, um estudo recente foi desenvolvido na fazenda experimental vinculada à Escola de Medicina Veterinária e Zootecnia da Universidade Federal de Bahia, com o objetivo de avaliar os efeitos da suplementação com monensina, ou a utilização de saponinas de forma isolada ou em combinação com óleo essencial sobre a composição e produção de leite em vacas Jersey.
Dessa forma, hipotetizou-se que a combinação de saponinas e OE pode melhorar a digestibilidade e a fermentação ruminal sem que ocorra impacto negativo no desempenho produtivo das vacas em comparação aos animais alimentados com a dieta contendo monensina.
MATERIAL E MÉTODOS
Para este estudo, foram utilizados um total de oito vacas Jersey em lactação canuladas no rúmen, com as seguintes características produtivas: Média de 100,5 ± 26,6 dias em lactação e, média de 17,6 ± 5,5 kg/dia de produção de leite.
O experimento foi desenvolvido em um delineamento em Quadrado Latino 4×4 replicado com períodos de 21 dias, sendo os últimos sete dias utilizados para a coleta de dados. Dessa forma, os animais foram alimentados com a mesma dieta controle basal e, aleatoriamente distribuídos para receber um dos quatro tratamentos experimentais, conforme descrito abaixo:
CON: Controle, sem aditivo alimentar;
SAP: 16 g/vaca/dia de um suplemento à base de pó de feno-grego de semente inteira (variedade Fenucold) padronizado em diosgenina, uma das principais sapogeninas esteroidais do feno-grego (2000 mg/kg, PHYTOSYNTHESE LAB);
SAPEO: suplemento de SAP combinado com uma mistura de OE naturais com os principais componentes do carvacrol (2500 mg/kg), cinamaldeído (5600 mg/kg) e limoneno (3000 mg/kg);
MON: Monensina, inclusão de monensina sódica (Poulcox 40®, Huvepharma, Bulgária) na dieta a 24 mg/kg de matéria seca (MS).
Além da composição e produção leiteira, no presente estudo foram avaliados os seguintes parâmetros nas vacas Jersey:
Consumo e digestibilidade aparente do trato total dos nutrientes;
Fermentação ruminal e quantificação bacteriana;
Balanço de nitrogênio e síntese de proteína microbiana;
Concentrações de metabólitos sanguíneos;
Perfil de ácidos graxos do leite.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Todos os aditivos diminuíram significativamente o consumo de matéria seca (CMS), com redução mais acentuada para monensina (-2kg CMS) (Tabela 1). Apesar disso, neste estudo, não houve efeito da inclusão dos diferentes aditivos nos coeficientes de digestibilidade aparente das frações nutricionais.
Da mesma forma, não foi observado efeito das dietas na produção de leite das vacas Jersey. Embora o delineamento experimental utilizado neste estudo não seja o mais adequado para avaliar o desempenho zootécnico, observa-se que a combinação de saponinas com óleos essenciais aumentou a eficiência energética, mensurada pela energia do leite divido pelo consumo de energia digestível (Tabela 1).
Além disso, os teores de proteína e gordura do leite de vacas Jersey foram significativamente melhorados pela adição de saponinas associadas aos óleos essenciais (Figura 2).
Apesar disso, não houve efeito das dietas avaliadas nas concentrações de lactose, extratos seco total e desengordurado, teores de nitrogênio ureico do leite, assim como, nas contagens de células somáticas, expressos em valores percentuais.
Similarmente, não houve efeito das dietas no perfil de ácidos graxos de cadeia longa no leite de vacas Jersey, com exceção das concentrações alguns ácidos graxos (C4:0, C6:0, C8:0, C18:1 cis-1).
Com relação aos parâmetros da fermentação ruminal, observou-se que os aditivos reduziram o pH ruminal e aumentaram a concentração de nitrogênio amoniacal ruminal em relação aos animais alimentados com a dieta controle (Tabela 2).
Esses resultados podem ser explicados pela atividade microbiana mais intensa. No entanto, não houve mudança significativa na produção total de ácidos graxos voláteis, embora a dieta contendo SAPEO tenha aumentado numericamente a produção total de AGV em + 9,6%. Entre eles, o butirato aumentou significativamente.
Além disso, neste estudo foi avaliado o efeito dos diferentes aditivos nas concentrações das principais populações microbianas no ambiente ruminal. De forma geral, observou-se que as dietas experimentais modificaram somente as populações de Fibrobacter succinogenes. Apesar disso, não houve efeito dos aditivos nas populações bacterianas de:
Ruminococcus albus
Selenomonas ruminantium
Streptococcus bovis
Pseudomonas ruminicola
Além das variáveis analisadas, o presente estudo teve por objetivo verificar o efeito da inclusão de óleos essenciais nas concentrações de metabólitos sanguíneos nas vacas Jersey.
A inclusão dos diferentes aditivos não influenciou as concentrações de proteína total, glicose, assim como as atividades das enzimas hepáticas aspartatoaminotransferase
e gama-glutamiltransferase.
Porém, vacas alimentadas com a dieta SAPEO apresentaram maiores concentrações de albumina em relação aquelas alimentadas com as dietas CON, SAP e MON. Além disso, as concentrações séricas de ureia diminuíram significativamente com a inclusão de saponinas sozinhas ou em combinação com óleos essenciais (Figura 3). Isso confirma resultados anteriores obtidos com produto incluindo saponinas (Devant et al., 2006).
Todos os aditivos aumentaram a concentração de amônia (NH3) ruminal e reduziram a ureia sanguínea, com maior significância com SAP e SAPEO.
Esse resultado é surpreendente, pois a literatura mostra que a ureia sanguínea está negativamente relacionada à concentração de nitrogênio amoniacal no rúmen. Além disso, muitos estudos in vitro demonstraram que óleos essenciais e saponinas reduziram a concentração de nitrogênio amoniacal no rúmen, reduzindo a desaminação de aminoácidos.
Esse resultado pode estar relacionado às capacidades de ligação ao NH3 da glicofração de saponina. O maior teor de proteína no leite pode apoiar essa hipótese, pois a manutenção de quantidade suficiente de amônia no rúmen pode aumentar a transferência de proteína microbiana e nitrogênio para o leite.
CONCLUSÃO
O objetivo do estudo foi avaliar os efeitos da suplementação dietética com monensina e saponinas isoladas ou combinadas com óleos essenciais (OE) em vacas leiteiras. Os resultados mostraram que a digestibilidade dos nutrientes e a utilização do nitrogênio não foram afetadas pelas dietas. Além disso, foi possível concluir através deste estudo que:
A monensina reduziu a ingestão de nutrientes para uma via mais eficiente energeticamente, mas não alterou a produção de leite, a digestibilidade ou a fermentação
ruminal;
A associação de saponinas e óleo essencial pode exercer um efeito sinérgico no rúmen, melhorando a qualidade do leite, a gordura e a proteína em vacas Jersey em lactação, em comparação com a monensina;
As saponinas sozinhas podem promover a transferência de nitrogênio para o leite por meio da retenção de amônia no rúmen.
O presente trabalho faz parte do seguinte artigo científico: Silva et al., 2021. Effects of plant extract supplementations or monensin on nutrient intake digestibility and ruminal fermentation and metabolism in dairy cows. Anim. Feed Sci. Technol.
O estudo foi realizado pela Universidade Federal da Bahia (UFBA) que disponibilizou os animais e a estrutura física dos laboratórios para o desenvolvimento do experimento. O produto foi fornecido pela empresa Phytosynthese (França).
Autores: José Esler de Freitas Júnior1, Sarah Nogueira da Silva e Silva2, Maria Leonor Garcia Melo Lopes de Araújo3 e Ricardo Diniz Guerra e Silva4
1 Universidade Federal da Bahia (UFBA), Salvador, Bahia. Bolsista de Produtividade em Pesquisa do CNPq – Nível 2.
2 Aluna de mestrado do Programa de Pós-graduação em Zootecnia da UFBA.
3 Pós-doutoranda do Programa de Pós-graduação em Zootecnia da UFBA.
4 Departamento de Anatomia, Patologia e Clínicas Veterinárias, UFBA.
Calsamiglia, S., Busquet, M., Cardozo, P.W., Castillejos, L., Ferret, A., 2007. Invited review: EOs as modifiers of rumen microbial fermentation. J. Dairy Sci. 90, 2580–2595.
Rhodes, M.J.C., 1996. Physiologically-active compounds in plant foods: an overview. Nutr. Soc. 55, 371–384. https://doi.org/10.1079/PNS19960036.
Santos, M.C.B., Araújo, A.P.C., Venturelli, B.C., Freitas Jr., J.E., Barletta, R.V., Gandra, J.R., Paiva, P.G., Acedo, T.S., Rennó, F.P., 2019. Effects of increasing monensin doses on performance of mid-lactating Holstein cows. Appl. Anim. Res. 47, 297–302.
Vendramini, T.H.A., Takiya, C.S., Silva, T.H., Zanferari, F., Rentas, M.F., Bertoni, J.C., Consentini, C.E.C., Gardinal, R., Acedo, T.S., Renno, F.P., 2016. Effects of a blend of EOs, chitosan or monensin on nutrient intake and digestibility of lactating dairy cows. Feed Sci. Technol. 214, 12–21.
Wang, B., Ma, M. P., Diao, Q. Y., Tu, Y., 2019. Saponin-induced shifts in the rumen microbiome and metabolome of young cattle. Microbiol. 10, 356.
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