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Enzimas exógenas em alimentos para cães e gatos: o que sabemos até agora?


O Brasil é um dos maiores produtores de grãos e de proteína de origem animal do mundo. O beneficiamento destes produtos para consumo humano gera consigo uma infinidade de coprodutos que podem ser incorporados nas formulações de alimentos para animais de companhia.
Embora possuam valor nutricional e energético satisfatório para contribuir com os requerimentos nutricionais de cães e gatos, muitos destes coprodutos possuem fatores antinutricionais que interferem negativamente no aproveitamento dos nutrientes pelos animais. Assim, torna-se necessário o emprego de tecnologias capazes de reduzir estes efeitos e que possibilitem o melhor aproveitamento dos nutrientes pelos animais e a redução dos custos de produção.

A eficiência do uso de enzimas exógenas em rações para aves e suínos já está bem consolidada. Entretanto, para animais de companhia os estudos ainda estão em fase inicial e os dados disponíveis na literatura são contraditórios.

Assim, este artigo aborda as principais características, funções e modo de ação das enzimas exógenas com potencial de uso na alimentação de cães e gatos, bem como, fornece informações sobre os estudos mais recentes realizados com cães e gatos.

FUNÇÕES DAS ENZIMAS

A estrutura molecular das enzimas é bastante frágil e para que possam ser utilizadas eficientemente em alimentos para animais de companhia é importante que elas resistam a adversidades como:
Processo de extrusão
Variações de pH no organismo
Ação proteolítica do trato digestório
Diversos tipos de processamento aos quais as matérias-primas são submetidas para sua produção

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COMO AS ENZIMAS TRABALHAM?

Em condições biológicas normais, as reações não catalisadas tendem a ser lentas e por este motivo, sem as enzimas, o processo de digestão dos alimentos, a contração muscular e tantos outros processos seriam biologicamente inviáveis (Nelson & Cox, 2006).
As enzimas fornecem um ambiente específico dentro do qual uma reação pode ocorrer mais rapidamente, sem que as próprias enzimas sofram qualquer alteração no processo (Figura 1). A formação do complexo enzima-substrato é fundamental para ação enzimática, tendo em vista que as enzimas são substrato dependentes.

As enzimas comerciais produzidas e usadas na alimentação animal, geralmente, são procedentes de bactérias do gênero Bacillus sp. ou fungos do gênero Aspergillus sp. ou Trichoderma sp. (Fireman & Fireman, 1998; Yin et al., 2001).
Embora a suplementação com enzimas exógenas em alimentos para animais de produção, especialmente aves e suínos, seja uma prática rotineira e visa auxiliar os processos digestivos. Em cães e gatos, os estudos com enzimas estão em fase inicial.
A variabilidade das metodologias empregadas para avaliar seus efeitos sobre a disponibilidade dos nutrientes tem dificultado a comparação dos resultados.

ESTUDOS COM ENZIMAS EM CÃES E GATOS

[registrados]
As principais enzimas estudadas para animais de companhia são aquelas que atuam sobre as fibras, as proteínas, o amido e o fitato.
CARBOIDRASES
Atuam sobre as estruturas complexas dos carboidratos, transformando-as em açúcares simples. Esta classe de enzimas é dividida em dois grupos principais:
Aquelas que hidrolisam polissacarídeos não amiláceos (xilanases e ß-glucanase)
Aquelas que atuam sobre o amido (amilase)

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FITASES
São enzimas que hidrolisam moléculas de ácido fítico existentes em muitos ingredientes derivados de plantas. O ácido fítico se liga a minerais, açúcares e proteínas formando complexos indigestíveis para cães e gatos. A quebra da molécula de ácido fítico libera, além do fósforo, as moléculas ligadas a ele e disponibiliza estes nutrientes para absorção intestinal


PROTEASES
São enzimas utilizadas para digerir proteínas armazenadas em diversas plantas e grãos. Atuam também sobre os inibidores de tripsina e sobre a lectina. As proteases também podem ser incluídas no processamento de ingredientes para clivar estruturas de difícil digestão, como as queratinas presentes nas penas de frango

Félix et al. (2012) avaliaram o efeito da inclusão do farelo de soja sobre a digestibilidade dos nutrientes e da energia bruta (EB), bem como no conteúdo de energia metabolizável (EM), em dietas para cães suplementadas ou não com uma mistura de enzimas exógenas contendo α-galactosidase, ß-glucanase e xilanase.
Os autores observaram maior digestibilidade da matéria seca (MS), matéria orgânica (MO), proteína bruta (PB), EB e conteúdo de EM nos alimentos contendo farelo de soja suplementados com 2 g/kg da mistura de enzimas.

Twomey et al. (2003a) investigaram o efeito da inclusão da enzima inulinase em dietas à base de cevada, trigo e coprodutos do trigo para cães adultos contendo 0, 30 e 60% de fruto-oligossacarídeo (FOS) comercial (10,4 FOS/kg).

No estudo, a enzima atenuou a capacidade fermentativa do FOS, aumentou o pH fecal, reduziu a concentração de lactato nas fezes e consecutivamente melhorou a qualidade fecal. A redução da produção de lactato, provavelmente, foi reflexo da modificação estrutural dos substratos disponíveis para fermentação.

Este efeito foi atribuído à clivagem das moléculas de FOS pela inulinase em pequenas moléculas de oligossacarídeos que entraram no intestino grosso. Entretanto, a enzima teve efeito limitado na digestibilidade dos nutrientes, melhorando apenas o CDA da PB da dieta.

Em contraste, Carciofi et al. (2012) realizaram dois experimentos avaliando o efeito da adição de α-amilase estável ao calor em dietas para cães adultos. Em ambos estudos não foram observadas melhoria na digestibilidade dos nutrientes, no conteúdo de MS das fezes e na palatabilidade dos alimentos para cães com a inclusão da enzima. Entretanto, verificaram menor gasto de energia elétrica e maior produtividade dos extrusados (Tabela 1).
O benefício no processamento foi atribuído ao efeito da α-amilase que hidrolisou a amilose presente na dieta e evitou a maior absorção de água, inchaço e fricção da massa com a extrusora, permitindo que a mesma se tornasse mais fluida e menos resistente ao fluxo no canhão de extrusão.

Twomey et al. (2003b) avaliaram o efeito da suplementação de um blend de enzimas contendo xilanase, ß-glucanase e amilase em dietas para cães contendo trigo e cevada como fontes de polissacarídeos não amiláceos (PNA) solúveis e constataram que a adição do blend foi capaz de melhorar o coeficiente de digestibilidade aparente (CDA) do amido, MS, gordura, EB e características fecais.
Isso permitiu a maior inclusão de ingredientes que continham índices maiores de PNA nas dietas, sem, contudo, causar efeitos antinutricionais significativos. O mesmo não foi observado em estudos com farelo de trigo; farelo de soja; farelo de arroz (Sá et al., 2013; Tortola et al., 2013; Pacheco et al., 2014).

Gonzáles-Sanchez et al. (2007) reportaram que a adição de fitase reduziu a digestibilidade da MS, fibra detergente neutro (FDN) e EB das dietas à base de flocos de milho e farelo de soja para gatos. Os autores relataram que o aumento na taxa de passagem do bolo alimentar no trato intestinal, causado pelo elevado teor de fibra da dieta, pode ter diminuído as chances de as enzimas atuarem sobre a digesta.
Por outro lado, Hernández-Anaya et al. (2006), usando fitase em dietas contendo 15,5% de canola para cães verificaram melhoras nos CDA de MS, MO, FDN e EB em todos os níveis de fitase avaliados, sendo as maiores médias observadas para o nível mais elevado.

A incorporação de enzimas em ingrediente único antes da mistura para produção de alimentos para o animal também tem sido investigada. Pacheco et al. (2016) avaliaram a adição de lipase e protease, associadas com redução da temperatura e pressão, no digestor para produção de farinha de penas hidrolisada (FPH). Os autores observaram aumento de 600 kcal de ED/kg de MS a partir das penas em comparação a farinha sem adição das enzimas (Figura 2).

De modo geral, podemos observar que a suplementação de enzimas exógenas nos alimentos para animais de companhia não apresenta efeitos marcantes sobre a digestibilidade e aproveitamento dos nutrientes pelos animais, exceto por alguns estudos que apresentaram efeito positivo.
Entretanto, podem ser uma alternativa para melhorar a qualidade individual de ingredientes e para auxiliar na redução de custos de produção, muito embora, mais estudos sejam necessários para indicar os melhores níveis de inclusão.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O desenvolvimento de tecnologias que possibilitem a elaboração de alimentos mais eficientes, com custo reduzido, maior produtividade e com nutrientes mais disponíveis para animais de companhia é ponto chave para sustentabilidade e desenvolvimento do setor.
Assim, a utilização de enzimas exógenas em alimentos para cães e gatos pode se tornar uma ferramenta interessante, caso as enzimas resistam as temperaturas aplicadas durante o processo produtivo de alimentos para cães e gatos, bem como, resistam a variabilidade de pH no trato gastrointestinal destas espécies.

Enzimas exógenas em alimentos para cães e gatos: o que sabemos até agora?

Gabriel Faria Estivallet Pacheco
Professor do curso de Zootecnia do Instituto Federal Farroupilha
Campus Alegrete. Alegrete –RS, Brasil

 

Referências bibliográficas
Carciofi, A. C. et al. (2012). Amylase utilization for the extrusion of dog diets. Animal Feed Science and Technology, 177, 211-217.
Félix, A. P. et al. (2012). Effect of the inclusion of carbohydrases and different soybean meals in the diet on palatability, digestibility and faecal characteristics in dog. Animal Feed Science and Technology, Amsterdam, 174, 182-189.
Fireman, F. A. T.; Fireman, A. K. B. A. T. Enzimas na alimentação de suínos. Ciência Rural, Santa Maria, v. 28, n. 1, p.173-178, 1998.
González-Sanchez, R. et al. Phytase effect on feed digestibility in domestic cat (Felis silvestris catus). Journal of Animal and Veterinary Advances, Faisalabad, v. 6, n. 2, p. 301-303, 2007.
Hernández-Anaya, A. et al. use of phytase in canola based diets and the digestibility of adult german shepherder. Journal of Animal and Veterinary Advances, Faisalabad, v. 5, n. 12, p. 1199-1201, 2006.
Murray, S. M. et al.  Raw and rendered animal by-products as ingredients in dog diets. Journal of Animal Science, Champaign, v. 75, p. 2497-2505, 1997.
Nelson, D. L.; Cox, M. M. Lehninger: Princípios de bioquímica. 4ª ed. p.190 – 235, 2006.
Pacheco, G. F. et al. Effect of fullfat rice bran on palatability and digestibility of diets supplemented with enzymes in adult dogs. J Anim Sci 92, 4598–4606, 2014.
Pacheco, G. F. E. et al. Inclusion of exogenous enzymes to feathers during processing on the digestible energy content of feather meal for adult dogs. R. Bras. Zootec., 45(6):288-294, 2016.
Sá, F. C. et al. Enzyme use in kibble diets formulated with wheat bran for dogs: effects on processing and digestibility. Journal Animal Physiology and Animal Nutrition, 97, Suppl. 1, 51–59, 2013.
Tortola, L. Enzyme effects on extruded diets for dogs with soybean meal as a substitute for poultry by-product meal, J. Anim. Physiol. Anim.Nutr. 97:39–50, 2013.
Torres, D. M. et al. Eficiência das enzimas amilase, protease e xilanase sobre o desempenho de frangos de corte. Ciência Agrotecnológica, Lavras. v. 27, n. 6, p. 1401-1408, nov./dez. 2003.
Twomey, L. N. et al. The effects of added fructooligosaccharide (Raftilose®P95) and inulinase on faecal quality and digestibility in dogs. Animal Feed Science and Technology, Amsterdam, v. 108, p. 83–93, 2003a.
Twomey, L. N. et al. The effects of increasing levels of soluble non-starch polysaccharides and inclusion of feed enzymes in dog diets on faecal quality and digestibility. Animal Feed Science and Technology, Amsterdam, v. 108, p. 71-82, 2003b.
Yin, Y, L. et al. Effects of supplementing diets containing hulles barley varieties having different levels of non-starch polysaccharides with β-glucanase and xylanase on the physiological status of the gastrintestinal tract and nutrient digestibility of weaned pigs. Livestock Production Science, Amsterdam, v. 71, n. 2, p. 97-107, 2001.

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