Para ler mais conteúdo de nutriNews Brasil 2 Trimestre 2021
O uso de pré e probióticos na alimentação de monogástricos
A microbiota do trato gastrointestinal de mamíferos compreende aproximadamente 1014 microrganismos e inclui uma ampla diversidade de espécies microbianas (Míguez et al., 2016; Yang e Xu, 2018; Yazad et al., 2020). O TGI é o órgão mais colonizado do organismo.
Sua microbiota está associada a uma ampla gama de funções dentro do hospedeiro, incluindo a fermentação de macronutrientes complexos, produção de nutrientes e vitaminas, proteção contra patógenos e manutenção do equilíbrio do sistema imunológico (Han et al., 2018; Li et al., 2020; Yin et al., 2018, 2020).
Estudos recentes indicaram que a dieta tem considerável efeito sobre a modulação da microbiota intestinal (Donaldson et al., 2016; Lalles, 2016). Alguns dos principais aditivos utilizados na nutrição animal para modulação da microbiota intestinal são os pre e probióticos
Probióticos |
Apesar dos probióticos já serem usados há muitos anos, foi na década de 1960, em que se demonstrou pela primeira vez que as cepas de Lactobacillus eram capazes de melhorar o desempenho de crescimento dos suínos (Ahasan et al. 2015).
Desde então, os probióticos mais frequentemente usados em monogástricos são as leveduras (Saccharomyces boulardii e S. cerevisiae) e as bactérias (Lactobacillus spp., Enterococcus spp., Pediococcus spp., Bacillus spp.) que tem como local de ação o ceco e o cólon.
Os benefícios mais comuns do uso dos probióticos para monogástricos são:
Aumento do peso corporal
Redução do risco de diarreia
Melhoria da eficiência alimentar
Aumento da digestibilidade da dieta (Ahasan et al. 2015).
É importante destacar que os probióticos desempenham um importante papel na prevenção de diarreia em leitões. Além disso, probióticos como Enterococcus faecium e Bacillus subtilis podem reduzir a concentração de amônia nas excretas das aves (Dhama et al. 2008), o que auxilia na manutenção da cama, na qualidade do ar nos galpões, na redução de problemas respiratórios e de queimaduras de coxim plantar.
Probióticos mais utilizados como aditivos na nutrição animal
Lactobacillus
Algumas espécies do gênero Lactobacillus utilizadas como aditivo alimentar demonstraram habilidades benéficas, em particular para reduzir a mortalidade em peixes, melhorar o desempenho de crescimento em leitões, melhorar a produção e a qualidade dos ovos nas aves.
É uma bactéria Gram-positiva pertencente ao grupo das bactérias produtoras de ácido láctico.
Além disso, os Lactobacillus foram associados à melhora dos mecanismos de defesa imunológica em peixes e na redução da contaminação por Salmonella em frangos de corte.
Bifidobacterium
As bifidobactérias são encontradas em grande número no intestino de animais e humanos. Sua presença geralmente indica a boa saúde intestinal do hospedeiro. Quando utilizada como aditivo alimentar em leitões, a espécie Bifidobacterium pseudolongum mostrou resultados significativos com melhor taxa de conversão alimentar.
Em aves, as espécies Bifidobacterium animalis, Bifidobacterium thermophilum e Bifidobacterium longum, quando usadas como aditivo alimentar, demonstraram, respectivamente, sua capacidade de reduzir a coccidiose em frangos infectados com Eimeria tenella, atividade protetora contra Salmonella e Listeria in vitro e contra E. coli em frangos.
No geral, as bactérias pertencentes ao gênero Bifidobacterium possuem potencial como aditivo para rações e como alternativa aos antibióticos convencionais.
Bacillus
Algumas bactérias deste gênero, como Bacillus subtilis, são regularmente usadas como suplemento alimentar, especialmente na piscicultura e na avicultura. Diversas pesquisas demonstraram que essas espécies possuem alto potencial de imunomodulação e proteção contra doenças.
Bacillus licheniformis também mostraram aptidões probióticas, quando usadas como aditivo alimentar em suínos, e se mostraram eficazes contra a diarreia que ocorre em leitões em 3-10 dias após o desmame causada por cepas enterotóxicas de E. coli.
Embora algumas espécies como Bacillus cereus possam causar problemas devido às endotoxinas e toxinas eméticas que produzem, bactérias do gênero Bacillus utilizadas como probióticos têm potencial e podem ser utilizadas na produção segura e como alternativa aos antibióticos convencionais.
Enterococcus[registrados]
Enterococcus é um membro comum da microbiota intestinal endógena de humanos e animais. Cepas de Enterococcus têm sido usadas como aditivos para rações em aves e suínos como alternativas ao uso de antibióticos nas rações. A cepa E. faecium demonstrou capacidade de estimular outras bactérias ácido lácticas (especialmente Lactobacillus) no intestino delgado de perus, melhora na conversão alimentar, na morfologia intestinal e manipulação benéfica da microflora cecal em frangos em frangos.
Porém, o gênero Enterococcus não apresenta apenas vantagens, pois essas bactérias podem participar da transmissão da resistência aos antibióticos. Além disso, esse gênero é frequentemente associado à patogênese, como infecções do trato urogenital e endocardite. Apesar de ter demonstrado bons resultados, o uso de probióticos pertencentes a este gênero deve ser verificado previamente para utilizar somente cepas que não apresentem qualquer perigo à saúde do animal.
Saccharomyces
Saccharomyces é um gênero de levedura de brotamento que também faz parte da microbiota intestinal. Neste gênero, S. cerevisiae é a espécie mais conhecida e mais utilizada como probiótico. É reconhecida por melhorar o desempenho reprodutivo de porcas, elevar a concentração de imunoglobulina G (IgG) no colostro e, subsequentemente, IgG plasmático de leitões, melhorar o desempenho de crescimento e promover intestinos “saudáveis” de suínos.
Resultados positivos do uso de S. cerevisiae também foram observados em peixes. Sendo capaz de melhorar o crescimento, as respostas hematológicas, antioxidantes e imunológicas da tilápia do Nilo, melhorar a resistência da tilápia do Nilo contra o fungo patogênico A. flavus, bem como aumentar a resposta imune inata da dourada. Outras espécies pertencentes a este gênero, como Saccharomyces carlsbergensis, também são utilizadas como probióticos na alimentação animal.
Prebióticos |
O conceito prebiótico foi iniciado pela primeira vez em 1995 por Gibson e Robertfroid (1995) e sofreu algumas alterações ao longo do tempo (Tabela 1).
Tabela 1. Definições de prebióticos
Os prebióticos, são carboidratos indigestíveis, sendo considerados fibras funcionais que não são digeríveis por bactérias patogênicas e nem pelas aves e suínos, sendo digeríveis apenas pelas bactérias benéficas. |
São diversos os prebióticos que podem ser utilizados na nutrição animal, como:
Mananoligossacarídeos (MOS)
Frutoligossacarídeos (FOS)
Glucoligossacarídeos (GOS)
Inulina
Arabinoxilanos oligossacarídeos (AXOS)
Quito-oligossacarídeos (CHOS)
Isomalto-oligossacarídeos (IMOS)
Glucomanano oligossacarídeos (OGM)
Oligossacarídeos de alginato (AOS)
Oligossacarídeos de pectina (POS)
Sendo, MOS, GOS e FOS os mais estudados e utilizados com aditivos na nutrição animal.
De acordo com Wang (2009), existem cinco critérios básicos para classificação de alimentos como prebióticos:
Resistência à digestão nas seções superiores do trato gastrointestinal
Fermentação pela microbiota intestinal
Efeito benéfico na saúde do hospedeiro
Estimulação seletiva para o crescimento de microrganismos probióticos
Estabilidade em várias condições de processamento de rações
Modo de ação
Os mecanismos de ação dos prebióticos incluem o bloqueio da porção receptora para adesão bacteriana; modulação da imunidade, produzida por compostos antibacterianos; aumento da exsudação no lúmen do intestino; além da indução de alteração morfológica na estrutura intestinal (Pourabedin e Zhao., 2015; Hammed, 2021).
Os prebióticos não são digeridos no TGI superior e acredita-se que sejam fermentados por bactérias seletivas assim que chegarem ao cólon. O ambiente no cólon é adequado para fermentação e crescimento comensal devido ao seu trânsito lento, disponibilidade de nutrientes e pH.
Assim, o ambiente ácido no cólon pode alterar a composição da microbiota, o que ajuda a suprimir o crescimento de alguns patógenos potenciais, como E. coli, Clostridium, Streptococcus faecalis e Proteus, e aumenta a crescimento de algumas bactérias benéficas, incluindo bifidobactérias, lactobacilos e Eubacterium (Morrison e Preston, 2016; O’Callaghan e van Sinderen, 2016; Zhang et al., 2015).
Os prebióticos podem estimular ou modular o sistema imunológico. Um dos mecanismos de modulação imunológica pelos prebióticos é atribuído ao estimulo da imunidade humoral por meio da interação do açúcar com receptores específicos localizados nos macrófagos e células dendríticas, que induzem a liberação de citocinas e proliferação de linfócitos (Saad et al., 2013).
A fermentação de carboidratos no cólon leva à produção de ácidos graxos de cadeia curta (AGCC), principalmente acetato, propionato, butirato e outros metabólitos, como lactato, piruvato, etanol e succinato (Janssen e Kersten, 2015; Sarbini e Rastall, 2011; Slavin, 2013).
Os AGCC são importantes pois podem reduzir a fermentação de proteínas no trato intestinal. O butirato, por exemplo, regula o crescimento celular e induz diferenciação e apoptose no intestino delgado, resultando em proliferação celular melhorada e digestão e absorção capacidades do intestino delgado (Linberg, 2014; van der Aar et al., 2017).
A presença de prebióticos como oligossacarídeos no intestino também pode aumentar a resistência de cepas probióticas por propriedades de adesão bacteriana. Os oligossacarídeos também auxiliam na manutenção da integridade da mucosa intestinal, aumentando a altura das vilosidades, a liberação de mucina e a composição do biofilme da mucosa (Wan et al., 2018a; Yasmin et al., 2015).
Alguns probióticos podem modular o sistema imunológico por ligação dos receptores da proteína G dentro tecido linfático associado ao intestino ou GALT. Outro modo de ação é via estimulo da produção de muco, diminuindo a conexão entre as bactérias e a barreira epitelial, aumentando a resistência celular e secreção imunoglobulina A (IgA) (Bischoff et al., 2014; Celi et al., 2019).
Alguns tipos específicos de prebióticos, como COS, inulina, AXOS e AOS, foram associados a efeitos imunomoduladores em monogástricos (Ding et al., 2018; Vogt et al., 2015; Wan et al., 2018b; Xiong et al., 2015). Em revisão conduzida por Seifert e Watzl (2007), concluiu-se que a adição dietética de inulina e FOS tem efeito no sistema imunológico, com impacto positivo nos biomarcadores imunológicos e em tecidos linfóides associados ao intestino, com referência específica a células como as placas de Peyer.
Diversos de estudos demonstraram que os prebióticos afetam positivamente a funcionalidade do sistema imunológico, alterando a expressão de citocinas pró-inflamatórias (Hu et al., 2018; Wan et al., 2018a; Wang et al., 2016a; Xiao et al., 2016).
Além disso, os prebióticos podem afetar o microambiente intestinal e a utilização de outros ingredientes não digeridos e compostos dietéticos, como antibióticos, minerais e vitaminas. A suplementação de inulina (1%, 2% e 3% de inulina padrão) para suínos aumentou as concentrações plasmáticas de zinco e ferro (Samolinska e Grela, 2017). Além disso, maiores concentrações de XOS (entre 0,1 e 0,5 g/kg) demonstraram melhorar a mineralização óssea diminuindo a taxa de substituição de carbonato para fosfato (Wang et al., 2017).
Pode-se observar que o uso de pré e probióticos é benéfico para a saúde, bem-estar e eficiência produtiva de aves e suínos. Esses aditivos, se bem utilizados, podem trazer diversos ganhos à produção animal, especialmente com as restrições crescentes aos antibióticos.
Leia mais!
Confira a Tabela 2021 exclusiva de Pré e Prebióticos nutriNews Brasil
O uso de pré e probióticos na alimentação de monogástricos
Autora: Márcia G. L. Cândido
Veterinária e doutora em Construções Rurais e Ambiência DEA/UFV | Editora nutriNews Brasil
[/registrados]