Para ler mais conteúdo de nutriNews Brasil 1 Trimestre 2021
INTRODUÇÃO |
Atualmente o Brasil possui o maior rebanho comercial de bovinos do mundo, com aproximadamente 214 milhões de cabeças, e as pastagens ocupam aproximadamente 150 milhões de hectares (IBGE, 2017).
A grande representatividade das pastagens no cenário da pecuária nacional se deve principalmente ao fato do pasto ser o alimento basal e de mais baixo custo da dieta de animais ruminantes.
Quando se trata de animais ruminantes, deve-se buscar otimizar o consumo de pasto, explorando a eficiência dos ruminantes na utilização de carboidratos fibrosos (principais constituintes do pasto), como principal forma de minimizar os custos com a alimentação. Isso torna o manejo de pastagens fundamental para se produzir com eficiência econômica e de forma sustentável.
Em sistemas de produção à pasto, os ajustes das taxas de lotação evitam o superpastejo da área, que causam degradação do solo e impactos ambientais, e o subpastejo, que reduzem o valor nutritivo e a eficiência de colheita da forrageira, impactando no desempenho animal e econômico da atividade.
Para cálculo das taxas de lotação é necessário que o pecuarista leve em consideração a demanda por parte dos animais (variável de acordo com o número e categoria animal) e a massa de forragem contida na área.
As metodologias tradicionais utilizadas para quantificar a massa de pasto se baseiam na:
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obtenção de amostras do pasto por meio do corte em molduras de área conhecida |
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seguida por secagem da amostra |
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obtendo-se o teor de matéria seca como a razão entre a massa seca e a massa fresca |
Porém, a nível de campo essa forma de monitoramento do pasto se torna trabalhosa, demorada e de custo elevado, seja pela mão-de-obra para amostragem, ou por equipamentos para secagem do material. Além disso, áreas de pastagens frequentemente apresentam grande heterogeneidade de solo, relevo e espécies.
Logo, a quantificação da forragem por corte direto, além de destrutiva, pode não ser representativa da área caso a amostragem não seja criteriosa.
Com o surgimento de novas tecnologias para aquisição de dados, como satélites, drones, robôs, e os mais diferentes tipos de sensores, tem aumentado a quantidade e a
variedade de informações obtidas no campo.
O advento da Agricultura Digital trouxe diversos avanços no monitoramento de lavouras. Pesquisas têm demonstrado que a utilização de dados obtidos por sensores a bordo de drones ou satélites podem predizer a altura e a biomassa de diferentes tipos de cultura (Harkel et al. 2019).[registrados]
Diversos outros estudos conduzidos no exterior já demonstraram também ser possível utilizar imagens de satélites como ferramenta para estimativa da massa e para o manejo de áreas sob pastagens assim como empregado na agricultura.
Um estudo recente conduzido no Brasil demonstrou boa acurácia dos índices de vegetação obtidos por sensoriamento remoto na predição da biomassa de pasto e que os mesmos podem ser utilizados no monitoramento de pastagens naturais (Guerini Filho et al. 2020).
Vários índices são gerados por meio de operações matemáticas com as informações que chegam dos satélites, algumas dessas informações são, inclusive, invisíveis ao olho humano.
Estes índices variam de acordo com a condição da vegetação e se correlacionam com os parâmetros biofísicos, como massa, altura, teor de nitrogênio, atividade fotossintética e produtividade.
Nesse sentido, foi conduzido um estudo sob a hipótese de que índices de vegetação obtidos por meio de satélites de moderada resolução espacial (Landsat-8 e Sentinel-2), podem predizer com acurácia a massa de forragem em pastos de Brachiaria (syn. Urochloa) no Brasil.
Para o estudo, dados de massa de forragem obtidos à campo entre os anos de 2015 e 2019 em quatro diferentes regiões do Brasil foram utilizados para avaliar:
Com base nos índices obtidos por meio de imagens de satélites com o objetivo calibrar uma nova ferramenta para facilitar a tomada de decisão à campo no âmbito do manejo de pastagens.
METODOLOGIA |
Durante a pesquisa, amostragens de campo para cálculo da massa de forragem foram realizadas em um total de 40 piquetes localizados em Viçosa-MG, Coronel Pacheco-MG, Patrocínio Paulista–SP e Sinop-MT.
As áreas experimentais que foram utilizadas para levantamento dos dados de campo são formadas predominantemente por espécies do gênero Brachiaria (syn. Urochloa) e foram monitoradas entre o verão de 2015 e o verão de 2019.
Para quantificação da massa de forragem à campo, diversos pontos foram selecionados aleatoriamente dentro de cada piquete e toda a forragem contida na área delimitada por uma moldura (0,25 m2) foi cortada rente ao solo e a amostra obtida foi pesada para determinação da massa fresca, e posteriormente secas em estufa para determinação do percentual de matéria seca (MS) na amostra.
Devido à relevante influência das condições meteorológicas sobre o desenvolvimento do pasto, dados de temperatura e precipitação dos locais correspondentes às amostragens também foram obtidos no Banco de Dados Meteorológicos para Ensino e Pesquisa (BDMEP) do Instituto Nacional de Meteorologia (INMET) e posteriormente combinados aos índices de vegetação obtidos por meio de imagens de satélites para predição da massa de forragem.
Os satélites utilizados para obtenção das imagens foram o Landsat-8, operado pela NASA (National Aeronautics and Space Administration) com resolução espacial de 30m e temporal de 16 dias, e o Sentinel-2, operado pela ESA (European Space Agency) com resolução espacial de 10m e temporal de 5 dias. Após a obtenção das imagens de satélites de forma gratuita nas respectivas plataformas, foram obtidos dados de reflectância da vegetação em diferentes faixas do espectro eletromagnético e calculado 3 diferentes índices (NDVI, EVI2 e OSAVI).
A escolha dos índices levou em consideração o fato de que o NDVI (Índice de vegetação da diferença normalizada) é o índice mais comumente utilizado para estimar a biomassa de diversas culturas, incluindo pastagens, porém tem perda de sensibilidade em condições de elevada biomassa verde e presença de solo exposto.
Logo, o EVI2 (Índice de vegetação aprimorado) foi escolhido para minimizar o problema de saturação do índice em condições de alta biomassa, e o OSAVI (Índice de vegetação ajustado ao solo otimizado) escolhido para minimizar a interferência do solo devido à grande heterogeneidade em termos de cobertura do solo nas áreas avaliadas.
Em áreas sob pastagem os referidos índices variam de 0 a 1, e quanto mais próximo de 1, maior é o vigor da vegetação e indicativo de maior biomassa disponível, ao passo que valores próximos a zero representam áreas de solo totalmente exposto ou com baixa cobertura por vegetação.
A Figura 1 representa mapas de cada um dos índices obtidos por imagens de satélites em uma das áreas do estudo durante o período seco do ano de 2016. Nota-se que os índices obtidos na maior parte dos piquetes caracterizavam a baixa biomassa de pasto típica dos períodos de estiagem e baixas temperaturas no Brasil.
Figura 1 – Mapas de índices de vegetação obtidos por satélites caracterizando período de baixa biomassa de pasto (11/07/2016).
Tanto o download, quanto o processamento das imagens foram realizados no software gratuito, QGIS®.
O índice médio calculado para cada piquete foi então utilizado para correlacionar com os dados de massa de forragem obtidos à campo em datas correspondentes à data de aquisição da imagem para posterior predição da massa. Foram encontradas correlações significativas entre os índices de vegetação e a massa natural (MN) ou seca (MS) do pasto Figura 3.
A Figura 2 representa um mapa do índice NDVI obtido através de imagens de satélites em piquetes de uma das outras áreas avaliadas durante o período chuvoso do ano de 2019. É possível perceber a mudança na condição do pasto em diferentes piquetes de acordo com os períodos de ocupação e descanso, e demonstra que esse tipo de mapeamento baseado em imagens de satélites pode indicar o momento de entrada ou saída dos animais em determinados piquetes.
Embora os mapas de índices de vegetação possam ser usados como indicadores da condição do pasto, é necessário transformar essas informações digitais em estimativa quantitativa da massa de forragem da área para ajustes de lotação.
Portanto, foi utilizado um algoritmo de Inteligência Artificial para predição da massa natural (fresca) e do percentual de matéria seca do pasto. O algoritmo utiliza uma combinação de diferentes índices de vegetação e dados meteorológicos.
Foram encontradas correlações significativas entre os índices de vegetação e a massa natural (MN) ou seca (MS) do pasto Figura 3.
Na Figura 4 são apresentados os resultados da massa natural de forragem medida em campo e predita pelo algoritmo de inteligência artificial em 24 pontos selecionados aleatoriamente entre os piquetes avaliados ao longo dos anos.
Na Figura 5 são apresentados os resultados do percentual de matéria seca medidos em campo e preditos pelo algoritmo de Inteligência artificial em 24 pontos selecionados aleatoriamente entre os piquetes avaliados ao longo dos anos.
Observa-se boa aproximação entre os valores reais e estimados tanto para predição da massa natural, quanto para predição do teor de matéria seca da forragem. A Figura 6 resume de forma esquemática o processo de obtenção dos dados à campo, calibração do modelo para estimar a massa de forragem e resultados obtidos.
A elevada acurácia de predição da massa fresca e do teor de matéria seca do pasto encontrada no estudo (R² = 0,85) indica ser possível quantificar a massa de forragem em pastos de Brachiaria (syn Urochloa) à baixo custo, de forma rápida e com acurácia suficiente para auxiliar no manejo de pastagens no Brasil. |
Mais detalhes do estudo e uma discussão mais ampla do conteúdo podem ser acessados no artigo “Prediction of aboveground biomass and drymatter content in Brachiaria pastures by combining meteorological data and satellite imagery” publicado na revista Grass and Forage Science, disponível em: https://doi.org/10.1111/gfs.12517.
Autores: Igor L. Bretas1
Fernanda. H. M. Chizzotti1
Domingos Sárvio M. Valente2
1Departmento de Zootecnia, Universidade Federal de Viçosa, Viçosa, Minas Gerais, Brasil
2Departmento de Engenharia Agrícola, Universidade Federal de Viçosa, Viçosa, Minas Gerais, Brasil
Guerini Filho, M., Kuplich, T. M., & Quadros, F. L. F. D. (2020). Estimating natural grassland biomass by vegetation indices using Sentinel 2 remote sensing data. International Journal of Remote Sensing, 41(8), 2861–2876. https://doi.org/10.1080/01431161.2019.1697004
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). (2017). Censo Agropecuário. Retrieved from: https://biblioteca.ibge.gov.br/index.php/biblioteca-catalogo?view=detalhes&id=73096 (accessed on 27 May 2020).
ten Harkel, J., Bartholomeus, H., & Kooistra, L. (2019). Biomass and Crop Height Estimation of Different Crops Using UAV-Based Lidar. Remote Sensing, 12(1), 17. https://doi.org/10.3390/rs12010017
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