Segurança alimentar X soberania e suficiência
Analisando as tendências futuras na aquicultura é possível ler claramente o crescimento da produtividade e ainda aumento da produção para atender a demanda por proteínas mais saudáveis e de menor impacto ambiental
A previsão da Organização das Nações Unidas (ONU) de que a população mundial chegará a 10 bilhões de pessoas até 2050, com 70% delas vivendo nas cidades, aparece no horizonte da aquicultura brasileira como uma responsabilidade e também uma grande oportunidade. Fica clara a necessidade de aumentar a oferta de alimentos preservando os recursos naturais, entre eles a água, para futuras gerações.
A reflexão vem da Diretora Executiva e organizadora do IFC 2022 – International Fish Congress & IFC Brasil a empresária e jornalista Eliana Panty Schwarz. Segundo a especialista em proteínas animais a tecnologia será a chave da virada:
Tecnologias estas que estarão em debate nesta quarta edição do International Fish Congress & Fish Expo Brasil. Panty destaca ainda que esses avanços reduziram os custos de produção, aumentaram a gama de produtos e reduziram os preços ao consumidor.
“Isso tornou os produtos de aquicultura competitivos em comparação com, por exemplo, carnes e produtos de pescado capturados na natureza. Há poucas dúvidas de que a produção aquícola continuará a crescer. No entanto, com um mercado competitivo, nem todos os países, regiões e espécies podem ter sucesso. Mudanças na produtividade relativa determinarão onde a produção ocorre e a necessidade de baixos custos unitários provavelmente limitará o número de espécies de aquicultura de alto volume” reflete.
Segurança alimentar X soberania e suficiência
“Há uma responsabilidade muito grande neste momento de tensão nos estoques de alimentos em produzir mais e com segurança alimentar. Nas últimas décadas os avanços foram imensos para produzir de forma orgânica, para produzir proteína animal com o menor impacto ambiental, com o uso racional de antimicrobianos e até em alternativas à proteína animal, buscando nos vegetais substitutos que agradem o consumidor. Mas neste momento os olhos se voltam não apenas para nichos de mercado, mas para uma questão humanitária, de cenário de guerra e pós pandemia, onde a soberania alimentar de países mais atingidos está fragilizada”, alerta.
Panty cita que de acordo com a análise do relatório ‘Global Aquaculture Market 2020-2030 by Nature’ a aquicultura global vai sofrer um grande desenvolvimento durante o período, mas em diferentes áreas, se comparado às ultimas décadas.
“O mercado deverá ser impulsionado pela rápida urbanização, aumentando a renda disponível, bem como o crescente conscientização sobre origem do alimento. Consumidores mais exigentes devem regular a oferta de produtos com maior rastreabilidade e certificações”.
“Os grandes players do mercado global são empresas que atuam no segmento de aquicultura de forma mais progressiva, liderando o maior crescimento do mercado, com isso obtendo a maior vantagem competitiva. Essas mesmas empresas são responsáveis pela conscientização sobre as aplicações e vantagens da aquicultura. O peixe está incluído na categoria de produtos que os clientes vão comprar com mais frequência e para preparo doméstico” avalia.
Importante analisar as previsões de que a Ásia-Pacífico tenha registrado a maior participação no mercado. Além disso, segmentos de aquicultura em países como China, Índia, Vietnã, Indonésia e Tailândia são orientados para a exportação; o segmento de aquicultura é de primordial importância nesses países, pois os players aqui estão visando a implementação de tecnologia e automação que devem ter um impacto positivo no mercado nesta região.
Ou seja o grande mercado consumidor é o grande produtor e exportador. Ressalvas para a capacidade de expansão e diminuição da velocidade de crescimento, diante de uma saturação da capacidade dos recursos naturais. Estes países tem produção intensiva, alto consumo e tecnologias muitas vezes 20 anos à frente de outras regiões. Tudo aponta para um crescimento mais sólido na América Latina e África Subsaariana.
Expandindo horizontes
Panty observa a recente migração de indústrias que atuam em proteínas como aves e suínos para a aquicultura, além do crescimento dos atuais players do setor: “No mundo todo os participantes do mercado na indústria da aquicultura implementaram aquisições, parcerias e acordos, fusão e expansão geográfica como sua principal estratégia de desenvolvimento para aumentar a lucratividade e avançar sua posição na participação no mercado de aquicultura”, observa.
Além do crescimento previsto pelos especialistas para o mercado do salmão, que mesmo durante a pandemia resistiu e cresceu, a piscicultura em terra aumenta em relevância.
“Um número crescente de projetos de grande escala baseados em terra conseguiu levantar capital suficiente para tornar relevante a produção em água doce da piscicultura continental. Apesar do progresso, ainda há desafios a superar como a logística da produção e oferta de grãos para alimentação e processamento distante dos grandes mercados consumidores”.
“Além dos desafios inerentes ao mercado de proteínas como cambio, exportações, custo das commodities e questões sanitárias, o impacto das alterações climáticas torna-se mais relevante. O aumento da temperatura da superfície do mar, o esgotamento do oxigênio, a acidificação dos oceanos, o branqueamento de corais e o aumento do nível do mar são apenas alguns dos fatores que influenciam a indústria da aquicultura hoje” reflete.
Alimentos em risco?
Recentemente uma manchete chamou a atenção “O mundo se aproxima de uma catástrofe no abastecimento de comida“, alertou a revista The Economist. Vista como apocalíptica por uns e meramente alarmista por outros a notícia de uma das principais publicações sobre economia do mundo sobre os efeitos da Guerra da Ucrânia é que estes se estenderão além das mortes, crises de imigração e humanitárias.
É que juntas, Ucrânia e Rússia fornecem 12% dos produtos alimentícios do mundo, só de cereais, a Ucrânia é a terceira maior exportadora, computando US$ 8.38 bilhões ao ano, apelidada de cesta de pães da Europa a área devastada pela guerra que se arrasta perdeu capacidade de produção de commodities que são a base da alimentação em boa parte do mundo.
O momento é de pós pandemia, guerra e calor extremo na Índia que devastou as produções agrícolas, junta-se a isso contratos futuros de trigo fechando no limite máximo de negociação em Chicago. A alta de 70 centavos de dólar aconteceu após a Índia anunciar que não exportará mais o grão devido às ondas de calor. A China, maior exportadora de trigo, já havia anunciado que, com a estiagem, a safra deste ano poderia ser a pior em décadas. Junto às grandes secas no nordeste africano, o resultado é uma possível crise no abastecimento mundial de alimentos.
“O desafio, mais que nunca é a adoção de tecnologias para produzir mais, de forma mais eficiente e ainda assim assegurar alimentos mais sustentáveis. Temas que serão discutidos no IFC 2022 com a presença de especialistas de 16 países. Uma forma de nortear o setor. Precisamos de genética de ponta, adaptada ao clima tropical, aguardamos novas enzimas que melhorem a eficiência alimentar, queremos manejos que melhorem a produtividade, de vacinas que controlem as ameaças sanitárias, de probióticos, prebióticos e aditivos que impulsionem o desempenho, e tudo isso está disponível no mercado hoje e poderá ser visto no IFC 2022”.
O IFC 2022 irá sediar dois grandes encontros sobre RAS, tecnologias de recirculação de água e sobre aquicultura multitrófica, um consórcio onde o substrato de um organismo serve de alimento para o outro no mesmo ambiente.
“Uma revolução sustentável está por vir, e já é realidade. Um sopro de esperança!”, diz Panty.
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