As enzimas desramificadoras surgiram como a revolução na eficácia das xilanases para degradar a hemicelulose das plantas. Elas permitem aumentar a digestibilidade total dos alimentos e, com isso, otimizar o custo das rações. A enzima desramificadora mais estudada atualmente é a arabinofuranosidase. Para melhorar a expressão dessas enzimas alvo, um novo método foi desenvolvido.
Os carboidratos representam a principal fonte de energia na alimentação animal. Eles são encontrados principalmente em cereais ou subprodutos de cereais. Contudo, além do amido, os principais carboidratos possuem polissacarídeos não amiláceos (PNAs), que não são facilmente digeridos pelos animais devido à ausência das atividades enzimáticas necessárias e, portanto, interferem na digestibilidade dos alimentos e na fisiologia intestinal.
Arabinoxilanos, principal PNA dos cereais
Os PNAs estão presentes nas paredes celulares dos ingredientes vegetais e são compostos principalmente por celulose, hemicelulose e pectina. Os PNAs solúveis são conhecidos por possuírem propriedades antinutricionais, pois encapsulam nutrientes e reduzem sua digestibilidade geral por meio de modificações no trato gastrointestinal.
Entre os cereais destinados à alimentação animal, o milho e o trigo são os mais utilizados. As paredes celulares dos tecidos externos do grão contêm principalmente celulose e complexos de xilano, juntamente com uma quantidade
significativa de lignina. Em contraste, no endosperma, as paredes celulares contêm quase exclusivamente arabinoxilanos (AX) e β-glucanos.
O arabinoxilano (AX) é composto por estrutura de unidades de xiloses interligadas, interligadas por ligações β-(1,4), que carreia ramificações de arabinose nas posições C(O)2 e/ou C(O)3 das unidades de xilose.
A proporção arabinose: xilose e a quantidade de ramificações de arabinose em diferentes posições no xilano são variáveis entre os grãos de cereais e também entre diferentes tecidos dentro do mesmo grão. Os heteroxilanos do milho contêm mais ramificações do que os do trigo e mais ácido glucurônico (8,3% vs. 2,6% de matéria seca).
O arroz é um dos cereais que mais apresenta ramificações em diferentes posições da xilose, além de conter uma relação arabinose: xilose de 2,8 a 5,6. Essa complexidade do arroz demandará uma estratégia enzimática diferenciada e afetará a suscetibilidade a enzimas exógenas. Mesmo que um elevado grau de ramificações e subtituições evite problemas de viscosidade, a quebra de tais estruturas melhorará a digestibilidade da ração
É importante considerar que, embora o trigo tenha mais PNAs totais, é o milho que apresenta a maior quantidade de arabinoses por unidade de xilose. Essa característica comprova a importância em trabalhar com enzimas desramificadoras na dieta.
Os polissacarídeos podem ser decompostos por enzimas hidrolíticas que fazem parte de um grupo maior denominado enzimas ativas em carboidratos (CAZymes – www.cazy.org). Elas foram classificadas em 5 grupos de acordo com seus domínios funcionais e módulos catalíticos: glicosídeo hidrolases (GH), glicosil transferases (GT), polissacarídeo liases (PL), carboidrato esterases (CE) e atividades auxiliares (AA). Juntos, esses cinco grupos participam da degradação dos diferentes compostos presentes na parede celular vegetal.
O grupo GH é subdividido em 133 famílias, com base na similaridade da sequência de aminoácidos das enzimas. A afinidade por conformações específicas do substrato pode variar de um grupo para outro, como por exemplo nas xilanases das famílias GH 10 ou GH 11.
As várias endoxilanases identificadas produzidas pelo Talaromyces versatilis diferem em tamanho molecular, pH ideal para ação e afinidade para substratos insolúveis ou solúveis. Dentre as oito diferentes endoxilanases de Talaromyces versatilis, XynD pertence ao GH 10, enquanto XynB e XynC pertencem às famílias GH 11. É justamente a característica individual de cada enzima que determinará a sua família.
Devido à sua elevada especificidade em relação a uma ligação, diferentes enzimas são necessárias para a degradação dos arabinoxilanos. Para que as endoxilanases tenham uma maior taxa de sucesso, é preciso que as arabinoses sejam retiradas previamente das cadeias de xilano.
As arabinofuranosidades (ABF) são enzimas glicosil hidrolases capazes de remover as ramificações de arabinose, deixando livre o caminho para atuação das xilanases. Portanto, são importantes no sistema hidrolítico para degradar hemiceluloses como arabinoxilanos, arabinananas e arabinogalactanas, sendo essenciais em dietas ricas em milho – cenário comum na América Latina.
As ABFs pertencem a diferentes famílias de GH GH43, 51, 54, 62,… e são capazes de liberar arabinose de xiloses mono- ou dissubstituídas em oligo ou polissacarídeos (Figura 1, De La Mare et al., 2015). Além disso, a principal característica das ABFs é ter um pH ótimo de ação enzimática mais baixo do que o das endoxilanases. A consequência direta no trato digestivo é a ocorrência da ação de desramificação na parte superior (estômago), enquanto as endoxilanases atuam posteriormente ao longo do trato digestivo.
ARABINOFURANOSIDASES: A REVOLUÇÃO NA EFICÁCIA DAS XILANASES
Para melhorar a eficiência do complexo enzimático proveniente de Talaromyces versatilis, uma abordagem original foi recentemente desenvolvida na área de biotecnologia molecular (Guais et al., 2015). A base do método era superexpressar um fator de transcrição (XlnR) que permite estímulos a genes para enzimas GH, resultando em uma expressão melhorada de várias xilanases novas, bem como novas arabinofuranosidases.
A Figura 2 mostra o efeito de intensificação das ABFs para eliminar substituições e degradar arabinoxilanos mensurados pelo método viscométrico. Qualquer que seja a xilanase simples obtida de Talaromyces versatilis (Xyn B, C ou D), a suplementação com uma ABF (Abf 51a) já potencializa a atividade da xilanase.
A adição de múltiplas arabinofuranosidases a uma xilanase melhora a degradação das partículas insolúveis de arabinoxilano. Os melhores resultados são obtidos pela combinação de xilanase D com diversas arabinofuranosidases (Figura 3).
O mais interessante é poder comprovar a sinergia entre as diferentes carboidrases e arabinofuranosidases (ABFs) de um complexo multienzimático (CME) também em experimentos in vivo.
Saleh et al. (2019) demonstraram os efeitos sobre os parâmetros zootécnicos de frangos de 35 dias alimentados com dietas à base de milho e soja suplementadas com Rovabio® Advance, um complexo multienzimático com enzimas desramificadoras (arabinofuranosidases).
As dietas do grupo Controle Negativo (CN) tiveram uma redução de 90kcal/kg da Energia Metabolizável Aparente (EMA) e uma média de 3% dos aminoácidos digestíveis (AAd). Ao analisar a conversão alimentar (CA), verificou-se que a redução de nutrientes afetou negativamente o desempenho dos animais.
Entretanto, quando o Rovabio® Advance foi adicionado à dieta CN, notou-se uma melhora na conversão alimentar, confirmando sua melhor liberação de nutrientes e, consequentemente, aproveitamento da dieta pelos frangos de corte. (Tabela 2).
O mesmo efeito foi publicado por Cozannet et al. (2017), que demonstraram que uma combinação dietética de carboidrases e arabinofuranosidases teve um resultado positivo no uso de energia e na digestibilidade de proteínas, gorduras e fibras insolúveis e solúveis em frangos de corte.
Além dos efeitos diretos ao melhorar a digestibilidade dos ingredientes vegetais, quando uma associação de enzimas carboidrase com enzimas desramificadoras é utilizada, também pode-se obter benefícios na saúde intestinal, conforme publicado por Lei et al. (2016), que utilizaram uma combinação de xilanase, ABFs e feruloil esterase (outro tipo de enzima desramificadora).
Saleh et al. (2019), no mesmo estudo, também demonstraram que a combinação sinérgica de carboidrases e ABFs aumentou os parâmetros sanguíneos relacionados à imunidade dos frangos (isto é, proteína total, globulina e títulos de anticorpos séricos contra Newcastle e influenza aviária H9N1).
CONCLUSÃO
A grande variedade de matérias-primas vegetais utilizadas na alimentação animal e a complexidade dos polissacarídeos de cada uma evidenciam a necessidade de uma ampla gama de enzimas, com o objetivo de amenizar a maior parte de seus efeitos antinutricionais e obter a total disponibilidade de seus nutrientes.
A utilização de xilanases isoladas, ou ainda combinadas com B-glucanases ou mananases, não é suficiente para maximizar o aproveitamento dos nutrientes oferecidos em dietas à base de milho/ soja.
O milho possui grandes quantidades de ramificações de arabinoses nas cadeias de xilano, demandando uma estratégia diferenciada para quebra destes PNAs.
Desta forma, além de um amplo espectro de diferentes xilanases que atuam em todo o trato digestivo, em diferentes pHs, uma gama de enzimas desramificadoras é necessária, como as arabinofuranosidases (ABFs), para aumentar de forma eficiente a liberação de nutrientes em dietas com milho/soja, muito comuns na América Latina.
Diversos autores comprovaram em experimentos in vivo que um complexo multienzimático contendo ABFs em conjunto com diferentes carboidrases pode trazer benefícios expressivos aos animais, relacionados não só ao aumento da digestibilidade dos nutrientes, mas também à melhora da saúde intestinal, sendo uma excelente alternativa quando é necessário para melhorar o valor nutricional de uma dieta, visando melhorar o desempenho animal e até mesmo reduzir os custos de formulação.
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